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“Amor é dos meus temas favoritos”

Nesta conversa com Gregório Duvivier falámos de humor, das mulheres, de Portugal mas também de amor. E foi ‘show de bola’.

Gregório é apaixonado por Portugal, tanto que pondera mesmo trocar a Bossa Nova pelo Fado daqui a dez anos. Por enquanto, aterrou em terras lusas apenas para a reposição de “Portátil”, que esgotou em 2015 e que regressa aos palcos portugueses, já a partir desta quarta-feira, dia 14 de dezembro, com a participação especial de César Mourão.

Gregório Duvivier é um dos fundadores do coletivo brasileiro Porta dos Fundos, cujos sketches humorísticos se tornaram fenómenos virais online no Brasil e em Portugal. Além de humorista e ator, é ainda escritor, poeta, guionista e cronista no jornal Folha de São Paulo, onde adora falar sobre temas polémicos.

O monólogo “Uma Noite na Lua”, que apresentou em Portugal em maio deste ano, valeu-lhe o prémio APTR – Associação dos Produtores de Teatro, no Brasil.

Menos de nove meses depois, está de volta ao nosso país para apresentar, pela segunda vez, o espetáculo de teatro de improviso “Portátil”, ao lado de Luís Lobianco, Gustavo Miranda e do humorista português César Mourão, que substitui João Vicente de Castro, por impossibilidade de agenda.

Os quatro estão prontos para encher o palco do Teatro Tivoli BBVA, em Lisboa (de 14 a 16 de dezembro), do TAGV, em Coimbra (dia 18), do Teatro Sá da Bandeira, no Porto (dias 19 e 20) e do São Mamede CAE, em Guimarães (dia 21).

Pelo telefone, Gregório parece tão descontraído quanto assertivo. E nem só de humor viveu a nossa conversa, que ‘rolou’ dias antes de chegar a Portugal. Falou-se também de amor, do humor das mulheres, do quão progressista é Portugal e até de perguntas inconvenientes. Uma entrevista, com pouca edição, para ler com muito sotaque brasileiro.

Com tantas vindas a Portugal, já tem os seus lugares favoritos? O que é que acha do País?

Sim, muitos! Eu sou apaixonado por essa terra, já fui cinco, seis vezes, sei lá! Desde que estreou o Porta dos Fundos que tenho sido acolhido muito bem aí, muito por causa do ‘Porta’. Sou apaixonado por Lisboa, Porto, Coimbra, Algarve, por tantos lugares… Só em Lisboa tenho ficado mais do que no Rio de Janeiro. Fico ali no Bairro Alto, na casa de um amigo, e sou louco por Lisboa. A cidade me lembra muito o Rio, mas mais o Rio de antigamente.

E um pouco mais pequeno?

Sim, exatamente. Mas o Rio às vezes é grande demais para tudo. E aí tem tudo o que eu gosto no Rio: o tempo, fresco, aquela luz linda, vistas maravilhosas, tem uma vida boémia enorme. Os portugueses bebem até muito tarde. No resto do mundo, fico dececionado porque os lugares fecham cedo; em Lisboa e no Porto não, eu me sinto em casa. E as pessoas são muito acolhedoras.

Qual é a expetativa para esta reposição de “Portátil”? Será a segunda vez que apresenta o espetáculo em Portugal, há sempre alguma expetativa em relação ao ano passado.

A expetativa é sempre alta, porque o público em Portugal é muito acolhedor, tanto que a gente sempre que vai com o ‘Porta’, leva um susto, porque é muito caloroso, muito português, então a expetativa é alta, até porque a gente conta histórias da plateia.

É sempre diferente, um espetáculo único, certo?

Exatamente. O público em Portugal foi sempre muito bom, porque é o público que a gente não está tão acostumado aqui no Brasil. O público no geral é engraçadinho, gosta de fazer “piadoca”. Imagina, a gente faz uma coisa que te irrita, o público aqui fala “o meu namorado”, coisas que não são um problema real da vida delas. E em Portugal, há respostas muito sinceras. Vocês falam de outras coisas, do tipo “a voz da minha melhor amiga”, imagina. É bonito, porque a gente faz o espetáculo que é comédia, mas que te dá o direito de ser às vezes dramático, às vezes poético, às vezes lírico, sabe? Tivemos espetáculos aí dos mais bonitos que a gente já fez, porque acho que são um público que, para além da comédia, também aceita o drama e a tristeza, e o Brasil tem uma negação com o conflito.

Tudo nesta peça é improvisado, desde a música às luzes. Como é que funciona, há ensaios antes?

Sim, ensaiamos, mas é um ensaio diferente, é mais um treino. Por exemplo, é um pouco como o desporto: no futebol, você não tem como ensaiar um jogo, mas pode treinar, então os nossos ensaios, na verdade, são simulações.

E a grande novidade desta reposição é César Mourão. Já conhecia o César?

Já, fiz com ele ‘Comédia À La Carte’, e era natural que ele agora fizesse o nosso [espetáculo de teatro de improviso com César Mourão, Carlos M. Cunha e Ricardo Peress]. Ele participou também no ‘Porta’. Além de ser fã dele, é um grande amigo português, gosto muito do humor dele, é muito rápido, muito espontâneo e ainda por cima, canta bem ‘pra cacete’. A peça é também musical, com números musicais improvisados, e então vai dar para ouvir essa bela voz do César Mourão.

Com o César também vai haver esse treino de improviso?

Sim. Não é que precise de muito treino, porque ele já é um improvisador e já conhece as regras da improvisação. Não parece, mas são muitas…

Para si o humor é…

O humor é um olhar novo para tudo aquilo que estamos acostumados a ver sempre da mesma maneira. Fazer humor é jogar um olhar novo, fresco, sobre o mundo, é um olhar sem vícios, é o olhar da criança, mas também o olhar do outro. Por isso é que o humor é tão útil.

Considera que as mulheres têm um sentido de humor diferente dos homens?

Sim, por causa da sociedade. Acho que é cultural, não acho que seja biológico. Acho que, desde pequeno, o homem é incentivado a fazer graça e piadas e a mulher, em geral, é censurada. Uma mulher que tenta ser engraçada é logo criticada, ‘ah, tá querendo se mostrar’, ‘tá querendo chamar a atenção’. Isto no Brasil. No geral, a mulher engraçada é reprimida, enquanto o homem é recompensado, e então acho que isso acaba, sim, fazendo com que o humor seja mais tradicionalmente masculino. Mas para mim não existe nada de biológico e, inclusive, isso está mudando, a nova geração de humor tem muitas mulheres muito engraçadas. Só em Portugal tem a Catarina Matos, uma humorista que eu gosto, a Filomena Cautela também. Tem muita gente legal. Portugal já tem uma tradicionalidade mais antiga, com Maria Rueff, que gosto muito. Tem muitas mulheres engraçadas, e não engraçadas de uma maneira feminina. Engraçadas, ponto final. Sem concessões.

Dentro do humor, há temas que goste mais de trabalhar, ou que recorra mais frequentemente?

Gosto muito das proibições, algo que é proibido, que é tabu. Acho que é onde moram as melhores piadas. Por exemplo, tudo aquilo que não se pode falar à mesa de jantar – de sexo, de política, de religião, temas que, em geral, geram conflitos, temas espinhosos, acho que aí é mais engraçado, porque é mais difícil. O humor evolui um pouco do risco, uma piada é engraçada quando ela é arriscada.

Há também a questão do timing…

Sim, também. Quanto mais rápido você fizer a piada, mais engraçada será.

Elogios como “foi uma das melhores coisas que assisti na vida” ou “sempre espero ansiosa pelo seu texto” são frequentes nas suas redes sociais. Recorda o comentário de um fã mais original, que lhe tenha ficado na memória?

O meu pai é músico, saxofonista, e ‘teve um cara’ que disse que se encontrasse o meu pai na rua, ia enfiar o saxofone no ‘traseiro’ dele. Não sei porquê, estava com raiva de mim, por causa de um texto, não sei. Que bom que meu pai não toca tuba, não é?!

Mas o Gregório gosta de escrever textos muitas vezes polémicos, que causem reações.

É, exatamente. Não me incomoda, não. Na Internet, as pessoas falam coisas que não significam que você seja a pessoa mais odiada do mundo. Tenho a sorte de estar num tempo onde as pessoas extravasam os pensamentos sem entraves.

A crónica que escreveu sobre Clarice Falcão (“Desculpe o transtorno, preciso falar de Clarice”) tornou-se viral e foi muito falada por cá. Também gosta de escrever sobre o amor?

Sim, o amor é dos meus temas preferidos, porque é um dos temas mais difíceis. É muito difícil falar sobre amor, porque você esbarra num mundo de precipícios, de dificuldades, como, por exemplo, a ‘cafonice’, como nós chamamos, que é o que vocês chamam de piroso. Essa é uma das dificuldades. Uma outra dificuldade é que você se está expondo demais. Quando você fala de amor, está falando de uma coisa muito sincera, muito pouco cínica. É uma crença vintage, quase! E, em geral, o humor é o contrário disso, é cínico, não acredita em nada. Gosto muito de falar de amor exatamente por causa do risco, das dificuldades. Acho que é dos temas mais difíceis de se falar.

É ator, guionista, cronista, poeta, escritor… destes papéis, qual é aquele sem o qual não pode mesmo viver?

Acho que para mim, o mais árduo talvez seja o palco, o teatro. No teatro é onde me sinto sempre mais à vontade, é onde me realizo mais. Gosto muito do calor da plateia, desse encontro que é espontâneo, que acontece uma vez só e que nunca se vai repetir. No teatro, aquilo que você faz, você nunca vai fazer de novo, é muito mágico. A escrita é muito solitária, você não tem público, não tem troca, não há encontro. O teatro é o contrário disso, é sempre festivo.

E se não tivesse estas profissões, o que é que seria?

A minha grande frustração é não ser músico. Queria saber tocar um instrumento muito bem. Toco muitas coisas mal: toco mal violão, trombone. Acho que uma pessoa que toca bem um instrumento, nunca está sozinha.

Onde é que se vê daqui a dez anos?

Quem sabe em Portugal?! Tenho pensado muito em ir para aí, o Brasil está a caminhar cada vez mais em direção ao fundo do poço e eu vejo um país muito difícil para se viver e para melhorar. Em Portugal, vejo o contrário: um país de vanguarda, do mundo, um país mais progressista, dos mais progressistas que eu conheço, em relação a tudo, a drogas, às questões de género, ao contrário do que vocês, portugueses, acham, inclusive.

Mas nem tudo é um mar de rosas…

Comparado ao Brasil, é um mar de rosas, de diamantes, de chantili…

Onde vê o coletivo Porta dos Fundos daqui a 10 anos?

‘Pra gente’ é um projeto de vida. Não queremos sair, nem largar. A peça “Portátil” é um dos desdobramentos do ‘Porta’, acho que o futuro é existirem desdobramentos cada vez maiores. Um dos projetos para 2017 é trabalhar a internacionalização.

A música que está a ouvir ‘on repeat’ agora?

O disco de António Zambujo com Chico Buarque.

O livro do momento?

‘Sete Anos Bons’, de Etgar Keret.

Uma pergunta inconveniente que lhe tenham feito?

É difícil dizer, são tantas! Mas, em geral, “tá namorando?”.

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