Para muitos de nós, é conhecido unicamente como a cultura mãe da kombucha. Mas a verdade é que o SCOBY – abreviatura de “symbiotic culture of bacteria and yeasts” (em português, “cultura simbiótica de bactérias e leveduras”) – é muito mais do que o resultado de uma fermentação saudável de kombucha, viva, cheia de sabor e benefícios.
Uma película de celulose criada pelas bactérias ao consumirem o etanol produzido pelas leveduras, o misterioso e fascinante SCOBY é também uma excelente adição à compostagem, pode ser utilizado na rotina de beleza como máscara e até mesmo como snack para os companheiros de quatro patas, na sua versão desidratada.
“Enquanto produtores de kombucha, o que mais nos fascina nele é a sua textura”, conta Maria Lima, fundadora da Aquela Kombucha, sobre a cultura simbiótica de bactérias e leveduras da marca.
“Cada fermentação é única e um SCOBY nunca é igual. Adoramos documentar as suas muitas formas, bolhas e formatos que nunca deixam de surpreender.”
Esta massa de celulose bacteriana tem despertado o interesse da indústria da Moda como um novo material vegan e biodegradável, e desfilou na Modalisboa Metaphysical como um dos “tecidos” usados por Ivan Hunga Garcia, que colaborou com Aquela Kombucha para utilizar o SCOBY da marca no seu estado original, assumindo-o como material orgânico vivo, na criação da sua mais recente coleção.
Ivan Hunga Garcia. © ModaLisboa | Foto: Ugo Camera
“Foi uma agradável surpresa recebermos o convite do Ivan para colaborarmos na sua coleção. É um tema que discutimos com regularidade e é ótimo contribuir para esta investigação”, diz Maria Lima.
“Fascinou-nos acompanhar o desenvolvimento das peçaspelo Ivan e a sua dedicação para com esta missão de desenvolver uma coleçãobiodegradável. É um processo extremamente desafiante trabalhar com materiais destanatureza, e em especial o SCOBY-leather, pois implica todo um processo defermentação à sua desidratação e modelagem.”
Moda e Sustentabilidade: o que é que o SCOBY nos pode ensinar
De nome O Último Prefixo, a coleção 2022/2023 de Ivan Hunga Garcia aborda a família de espécies Neohominidae, sucessora do ser humano, e como de algum modo a mesma se insere no ecossistema, e a sua relação entre outras matérias vivas, numa cadeia de sobrevivência.
“Esta coleção foi um momento de aplicação de técnicas por algum tempo imaginadas de forma utópica”, conta o designer português.
“Especificamente sobre o SCOBY, as propriedades vivas e a noção de uma comunidade de cultura bacteriana numa superfície aplicável ao design não só suscita um incentivo a uma inter-relação entre seres e corpo/vestuário, como questiona toda uma nova perspectiva de moda ‘descartável’, no sentido orgânico da palavra. Esteticamente, a sua proximidade com a pele humana excluiu todas as alternativas artificiais e sintéticas, como o látex e o vinil.”
É nesta procura e exploração do biodesign que Ivan Hunga Garcia viu na Aquela Kombucha a companhia perfeita para colaborar na coleção O Último Prefixo abrindo novas portas à urgente relação entre Moda e sustentabilidade, e levando-nos a repensar o potencial de matérias pouco convencionais na criação de peças de roupa.
“Sem dúvida que tecidos biodegradáveis são uma tendência que veio para ficar. Vai além da moda, pois é uma questão de sobrevivência”, defende Maria Lima.
“É urgenteencontrarmos soluções alternativas às atuais, para reduzirmos o impacto no meioambiente sobrecarregado com tantos materiais descartáveis. É ainda mais importantetrabalhar com o desperdício e criar uma economia circular, em que o excedente de um éa matéria-prima de outro. Não podemos roubar mais à natureza, por isso materiaisresultantes da fermentação, criados em laboratório, são soluções excelentes para umfuturo de consumo mais em sintonia com a natureza.”
E, apesar de não ter ganho nenhum dos três prémios da competição Sangue Novo, a verdade é que Ivan Hunga Garcia se destacou pela diferença e criatividade na coleção O Último Prefixo. Transportou-nos para um mundo e, até, uma dimensão completamente diferente.
