

Ativista nata, dedicou-se, nos últimos 16 anos, à evolução da consciência humana, facilitando processos transformadores para mais de 63 mil pessoas em todo o mundo. Fundadora da Working with Satya e da Awareness Facilitator School, desenvolveu um método que combina técnicas terapêuticas modernas com a sabedoria ancestral. Falamos de Rita Rocha, ou melhor, Satya, a protagonista de ‘Espírito Livre’, o editorial de moda da nossa edição de novembro, em banca. Conversámos com a ativista para conhecer a sua missão e saber um pouco mais sobre o trabalho que desenvolve.
Antes de mais, quem é Satya? Como é que se apresenta, nas suas próprias palavras?
Sou um ser humano, mãe de gémeos de 17 anos, e dedico a minha vida a uma missão que é maior que eu: a evolução da consciência. Não separo quem sou daquilo que é o meu trabalho. Depois de ter estudado direito, de trabalhar como diretora internacional de Marketing para uma marca de surf, escolhi dedicar-me à cura, ao desenvolvimento interior, por perceber o quanto impactou a minha vida e que estes processos poderiam ajudar outras pessoas a recuperarem a sua vida tal como foram cruciais na minha.
E porquê Satya? De onde vem o nome e o que significa?
Rita é o meu nome de nascimento e nunca pensei mudar – posso até confessar que tinha algum preconceito em fazê-lo. No entanto, num processo muito intenso em que participei, esse momento de me ser oferecido um nome, surgiu. Ma Prem Satya, em sânscrito significa o amor à verdade ou a verdade do amor… naquele momento em que o meu braço subiu para o aceitar, percebi como ressoava dentro de mim essa honra de carregar um nome que é um compromisso, um pilar da minha cura e da minha vida e a primeira chave de transformação. E é daí que nasce a Working With Satya – mais do que trabalhar comigo é sobre trabalhar com a Verdade, é sobre sermos verdadeiros – connosco próprios, em primeiro lugar.
O que é ser Facilitadora Internacional de Consciência. O que é que isto quer dizer?
Ser uma facilitadora de consciência é abrir um espaço sagrado para que aquele ser humano possa encontrar transformação e autodescoberta, ajudando-o a expandir a sua consciência e a lidar com questões emocionais, mentais, físicas e espirituais. Usamos um método integrativo e holístico que desenvolvi através da minha própria experiência – percebi que apenas na terapia mais convencional ou só no caminho espiritual não encontrava todas as respostas que precisava e isso levou-me a desenvolver o “Awareness Facilitator Method” – usamos diferentes práticas e ferramentas que fui estudando e pelas quais também passei no meu próprio processo: desde Breathwork, bioenergética, trabalho de exposição e outras técnicas psicoterapêuticas, mas também rituais ancestrais que permitem tocar nas camadas mais subtis do nosso ser e reconectar-nos com o conceito do sagrado, que foi sendo perdido com a velocidade da nossa evolução. Os psicadélicos naturais também fazem parte, mas não os vejo como uma ferramenta psicoterapêutica, são muito mais do que isso, são chaves de expansão de consciência que permitem um trabalho muito sério e profundo. Antes de chegarem a qualquer processo guiado por mim, todas as pessoas passam por um protocolo de preparação que inclui um longo questionário sobre as várias dimensões da sua vida e uma entrevista que, no caso dos retiros com psicadélicos naturais é um passo decisivo para a participação, uma vez que analisamos a fundo o estado da pessoa e a toma de medicação/ suplementação ou questões de saúde, que podem impedir a sua vinda. Nunca é demais dizer que os psicadélicos não são para toda a gente, há pessoas que não os podem tomar em determinado momento da sua vida, ou nunca, e aí tentamos perceber como podemos facilitar o processo de cura e de evolução através de outras ferramentas e práticas.
Ou seja, o seu interesse pelo estudo da consciência deriva, então, da sua própria busca? Da sua busca pela sua cura?
Desde muito nova, sempre senti uma curiosidade profunda pela filosofia e pelos temas da existência – o que fazemos aqui, qual o sentido da vida… A par desta inquietude interna, a minha própria experiência de vida acabou por ditar a minha procura por ajuda. Fui abusada sexualmente entre os 5 e os 13 anos e as consequências desse trauma levaram-me a procurar suporte tanto na terapia como em diferentes religiões e comunidades espirituais. Sem ter passado pelo que passei, certamente não estaria neste lugar e a falar para tanta gente que passou e passa pelo mesmo e suportando esses processos para recuperarem uma vida com qualidade. Aos 11 anos, encontrei na meditação uma prática essencial que me ajudou a aproximar-me de mim e tornou-se base na minha vida e no meu trabalho. Aos 16, comecei a minha terapia – na qual me viria a formar – procurando libertar-me das feridas emocionais e recuperar a minha saúde emocional, mental e física. A ligação com a natureza, especialmente através do surf, também desempenhou um papel fundamental no meu processo de cura, proporcionando uma reconexão profunda comigo mesma e com o mundo ao meu redor. A Natureza é, para mim, a maior dos mestres. À medida que fui descobrindo o poder da minha cura, senti um apelo profundo para partilhar esse conhecimento com os outros – porque é possível recuperar e fazer desta vida, que é uma bênção, algo bem maior que cumprir papeis ou viver sob as consequências do trauma. Eles não têm de ser uma sentença, pelo contrário, podem ser portas para a sabedoria. Percebi que a escuta genuína, a compaixão autêntica e a compreensão profunda são elementos essenciais para o crescimento e a transformação. A minha missão passou a ser facilitar processos para outras pessoas poderem fazer o seu caminho de cura, superarem os seus medos e a acederem à sua própria sabedoria interior. Acredito que a evolução da consciência é fundamental para a mudança do paradigma da humanidade – no meu entender é a única chave para o desenvolvimento de uma sociedade global mais humana e evoluída.
E parte, também, dessa grande capacidade de se questionar?
Sem dúvida. É a forma de encontrar a minha responsabilidade em cada situação, a forma de colocar os meus limites, a única forma de evoluir. Sempre me questionei sobre o mistério da vida: a nossa existência, a morte e o nosso propósito. Acredito que o verdadeiro crescimento surge quando nos permitimos questionar e, através disso, encontramos as respostas que nos conduzem à transformação e a viver de forma mais livre dentro de nós e com os outros. E este é um processo “para a vida” – podemos sempre evoluir. Continuo a fazer o meu trabalho diariamente e acredito que é também só assim que posso estar preparada para continuar a facilitar processos de outras pessoas.
Como surge, então, a vontade e a capacidade para apoiar e guiar outras pessoas?
A vontade de trabalhar com outras pessoas surgiu da minha própria vivência – do caminho de dor e cura que percorri – e dos métodos que aprendi ao longo dos anos, através de formações em terapias e práticas da sabedoria ancestral.
No meu trabalho com as pessoas, abro o espaço onde facilito processos que trazem mais consciência e uma reconexão com o que é importante para cada um, através do método que desenvolvi e que deu origem à escola que fundei em 2019, por onde já passaram mais de 300 alunos. Procuro criar um espaço seguro, honesto e profissional, onde cada pessoa tem a coragem e a vontade de se confrontar, de olhar para a sua sombra, traumas e dificuldades — partes de nós que reprimimos, mas que habitam no nosso ser e que, sem as abraçar, passam a controlar as nossas vidas sem nos apercebermos. Por exemplo: quando não nos sentimos amados em crianças, podemos seguir a nossa vida a acreditar que não podemos ser amados e, muitas vezes, sabotamos as nossas relações. O meu trabalho tem sempre o propósito de levar cada pessoa a um ponto onde possa mergulhar na auto-observação. Porque é através do silêncio interior, dessa capacidade de investigar internamente, que começamos realmente a ver quem somos, o que fazemos, e podemos escolher conscientemente como agir, sem sermos escravos dos pensamentos, dos sentimentos ou das reações automáticas. A consciência permite essa escolha — é a chave para nos tornarmos quem realmente somos.
Como se desenvolveu o seu percurso? Que estudos, práticas e experiências a prepararam para se tornar Facilitadora Internacional de Consciência Espiritual?
Estudei Direito, mas, paralelamente, comecei cedo o meu percurso no campo da espiritualidade e cura. Ao longo dos anos, aprofundei os meus estudos e práticas em áreas como meditação, breathwork, Somatic Experiencing, libertação de traumas, primal work, xamanismo, leitura de energia e fire-walking. Viajei extensivamente em busca dos métodos de cura mais antigos e da sabedoria que ainda reside nas tribos indígenas. Neste longo caminho xamânico, recebi ensinamentos e bênçãos para o meu trabalho de diversos Xamãs, como José Campos (Xamã Peruano), Carmen Vicente (Xamã Equatoriana), Don Toño (Xamã Huichol), entre outros. Através destes professores e outros, expandi a minha ligação às plantas sagradas e aos psicadélicos naturais, que integro no meu trabalho de cura. Este caminho preparou-me para um trabalho que vai além do individual e que responde a uma necessidade coletiva da nossa sociedade. Vivemos num mundo ferido, onde traumas, sombras e dor habitam em cada um de nós. A crescente prevalência de depressão, de ansiedade e as taxas alarmantes de suicídio refletem essa realidade de forma avassaladora. Se quisermos curar o coletivo, precisamos de ir à raiz dessa dor, de entender como podemos apoiar cada pessoa a encontrar o seu próprio caminho, a despertar a consciência. Sentimos como tudo e todos estamos interligados, como somos interdependentes… e isso muda o nosso estar no mundo, relembra-nos os princípios universais – traz-nos integridade.
No site pode ler-se que “o seu trabalho principal consiste em combinar rituais antigos com técnicas terapêuticas contemporâneas”. Que rituais e técnicas contemporâneas são estas que utiliza?
O meu trabalho reflete uma visão de cura holística e integrativa. Holística porque quando falamos de cura, vamos além do cuidado médico. O cuidado médico é essencial – trata das necessidades físicas imediatas, com base em práticas e tratamentos comprovados. No entanto, na minha perspetiva, a verdadeira cura envolve todas as dimensões do ser: emocional, mental, física e espiritual. A cura integrativa faz a ponte entre diversas técnicas e práticas, entre a ciência e a espiritualidade, a sabedoria ancestral e a terapia moderna. Ao longo dos últimos 16 anos, guio retiros com e sem o uso de psicadélicos naturais. Os retiros com psicadélicos, quando guiados com muito cuidado e processo integrativo, facilitam a expansão da consciência e permitem o acesso a traumas e dores, a áreas do ser que muitas vezes não são acessíveis pelas terapias convencionais, ou demoram demasiado tempo para lá chegar. Muitas pessoas relatam que numa cerimónia com psicadélicos naturais chegaram ao que não foi possível em 10 ou 20 anos de terapia, e é verdade… Mas, como já mencionei, não é um caminho para todas as pessoas. Por outro lado, os retiros sem psicadélicos permitem-nos mergulhar em temas específicos que nos tocam a todos – a criança interior, a relação com pai e mãe, a autenticidade, as adições, a sexualidade, entre outros, e utilizo práticas como a meditação, o breathwork, a bioenergética, rituais ancestrais, música e movimento. Há um foco na cura que toca todas as nossas dimensões e onde cada um tem a oportunidade de dar passos importantes no seu desenvolvimento e transformação.
A quem se destina? Qualquer pessoa pode beneficiar do seu tratamento? Podemos chamar-lhe tratamento?
O meu trabalho destina-se a pessoas que estejam dispostas a embarcar numa viagem de autoconhecimento, transformação e expansão. O nosso foco vai além de aliviar sintomas de mal estar ou doenças mais ou menos graves; trabalhamos nas raízes das questões, onde reside o verdadeiro potencial de mudança: ao nível da consciência. Ao expandirmos a consciência, criamos oportunidades de cura na vida daquela pessoa e de quem a rodeia. Não vejo o meu trabalho como um “tratamento” no sentido clínico tradicional. O que oferecemos são espaços para reconexão interior, onde cada pessoa pode redescobrir-se, transformar os seus medos em força e curar feridas emocionais profundas. Este trabalho ao longo dos anos, demonstrou que, quando uma pessoa passa por uma cura profunda nas dimensões emocional, mental e espiritual, o corpo físico também segue esse processo de transformação. Presenciámos a evolução positiva na cura de doenças graves, incluindo cancro e doenças autoimunes, em pessoas que, através deste processo, redescobriram o equilíbrio e a harmonia entre o corpo e a mente. É importante dizer que não se pode prometer a cura a ninguém, mas que fazemos tudo o que podemos, incluindo a partilha com médicos e profissionais de saúde orientados para a questão que aquela pessoa nos traz. O que asseguramos é que o espaço é aberto e eu estou inteiramente ao lado de cada pessoa que nos procura, mas são várias as dimensões que envolvem estes processos.
Já facilitou processos transformadores a mais de 63 mil pessoas em todo o mundo e foi convidada a falar sobre saúde mental, consciência e psicadélicos nas Nações Unidas e é membro do The Drug Science Medical Psychedelics Working Group. O que é este grupo de trabalho?
A Drug Science é uma organização no Reino Unido dedicada à investigação científica sobre o uso terapêutico de substâncias químicas. O grupo de trabalho do qual sou membro, tem como objetivo explorar o potencial dos psicadélicos, como a ayahuasca, no tratamento de condições como depressão, ansiedade e traumas – mas eles próprios estão abertos a abraçar o que a sabedoria ancestral explora há milénios e fazer essa ponte com eles, é o meu principal papel ali. O foco central é assegurar que estas práticas sejam realizadas de forma ética, com formação adequada e sempre priorizando a segurança, o bem-estar e trazer benefícios para todos os participantes. Como membro deste grupo, trago a minha experiência com plantas medicinais e rituais xamânicos, promovendo um diálogo entre a ciência e a espiritualidade no contexto da cura. Esta colaboração permite fortalecer a ponte entre a sabedoria ancestral e a investigação científica moderna, contribuindo para o desenvolvimento de diretrizes que garantam uma prática responsável, informada e segura no uso de psicadélicos ao mesmo tempo investigando todo o seu potencial e não os vendo apenas como uma ferramenta terapêutica ou uma “nova” medicação.
Como é que tudo isto é encarado a nível internacional?
A nível internacional, o uso de psicadélicos em contextos terapêuticos está a ganhar cada vez mais reconhecimento, especialmente com os avanços da neurociência que comprovam os benefícios destas substâncias na cura de traumas profundos. Tenho tido a oportunidade de falar em eventos globais, como as Nações Unidas e Milken Institute sobre a importância da saúde mental e a expansão da consciência. Há um interesse crescente em como a sabedoria ancestral e os psicadélicos podem contribuir para a transformação pessoal e coletiva, mas também há ceticismo, que é natural quando falamos de práticas que desafiam o paradigma médico convencional. Acredito que estamos a viver um momento de grande abertura e diálogo. A ciência tem muito a aprender com as práticas antigas, e se as integrarmos nos seus protocolos, podemos evitar que os psicadélicos se tornem apenas mais uma solução comercial para aliviar sintomas. É fundamental preservar a espiritualidade, os rituais e as cerimónias, pois têm muitos elementos que realmente desbloqueiam o potencial de cura. E também considero de extrema importância que os Xamãs e curadores indígenas integrem práticas terapêuticas que possam suportar as necessidades de quem os procura. Foi um dos meus objetivos quando comecei a liderar cerimónias na Amazónia e é um dos projetos que temos: conseguir fundos para trazê-los para a nossa escola – porque eles têm interesse em aprender e ter mais conhecimento sobre outras formas de ajudar os seus grupos. Este é um momento crucial na Humanidade, uma oportunidade para expandir a nossa consciência coletiva e transformar verdadeiramente a sociedade. Uma mudança que deve ir além da simples melhoria do bem-estar individual — deve ser um processo de transformação que nos leve a construir um mundo mais justo, onde as futuras gerações possam viver sem guerras, com acesso a recursos essenciais e em harmonia com o planeta.
A saúde mental tende a ser deixada para depois. Mesmo numa altura como a que vivemos, em que as pessoas precisam de apoio, depois de uma pandemia, com a guerra e a crise climática, são tantos os receios e, mesmo assim, há, ainda, muito ceticismo em relação à psicologia. E depois, no meio de tantas promessas de ajuda de diversas terapias alternativas, por onde é que uma pessoa começa? Como é que se percebe e se escolhe a que tipo de ajuda se deve recorrer?
A verdade é que vivemos numa sociedade que nos empurra para o imediato: comida rápida, experiências fugazes, relações breves. Estamos a atravessar uma crise de valores e princípios, totalmente desconectados da Natureza, onde as distrações e superficialidades da vida moderna nos fazem esquecer as verdades essenciais que sustentam uma existência plena e conectada.
O primeiro passo no processo de cura é escutar-se, perceber o que está a sentir e o que realmente procura. A partir daí, pode explorar diferentes abordagens – seja a psicologia tradicional ou terapias alternativas – mas sempre com consciência e responsabilidade. Todos carregamos traumas, o stress das nossas vidas e até as feridas dos nossos antepassados. Curar a alma é ver, aceitar e transformar estas camadas de dor. Despertar a consciência traz liberdade a vários níveis. Esta liberdade permite-nos viver com verdade, amar e restabelecer a nossa ligação connosco, os outros, a Natureza e o Mistério da Vida. Por isso, escolher o caminho da consciência (chamemos-lhe cura, evolução…) deve ser um processo cuidadoso, mas a viagem começa dentro de nós, ao escutar a nossa verdade interior, permitindo-nos explorar abordagens que ressoem connosco e com o que mais precisamos em cada fase da vida.
Qual é a grande ajuda que as pessoas que a procuram, pretendem? Ou, por outro lado, procuram-na em que circunstâncias?
As pessoas que me procuram estão, geralmente, em busca de transformação e de conseguirem mudar algo que lhes causa sofrimento. Muitas vezes, chegam com feridas emocionais ou espirituais, traumas como abuso sexual, militares e ex-militares com trauma de guerra, pessoas com uma sensação de desconexão consigo mesmas e com a vida, ou mesmo pessoas a enfrentar doenças graves para as quais a medicina convencional não consegue dar resposta. Procuram um espaço seguro onde possam explorar essas dores e encontrar formas de terem mais qualidade de vida e de reconexão com o seu propósito. Muitas delas já tentaram outros métodos e escolhem um caminho diferente, porque têm um desejo profundo de viver verdadeiramente e sair do modo de sobrevivência. Trabalhamos com pessoas que enfrentam diversas condições de saúde, como doenças autoimunes, cancros, depressão, PTSD, ansiedade e distúrbios alimentares. Há também quem me procure em momentos de transição, quando sente a necessidade de uma mudança, de uma nova direção ou de um mergulho profundo na sua própria essência. É ainda bastante comum procurarem retiros quando estão a atravessar divórcios ou crises nas relações amorosas, com os filhos, quando se sentem perdidos e dizem “já não sei quem sou”. Para mim é uma honra receber cada um deles e atravessar em conjunto aquilo que tiver de ser, para irem dando os seus próprios passos rumo à vida que desejam.
Como vê a evolução do papel da consciência nos próximos anos?
O papel da consciência na nossa evolução global é fundamental. À medida que mais pessoas reconhecem que a consciência vai além do intelecto—uma força viva, superior, que atravessa gerações e culturas—somos conduzidos para um novo paradigma. Este paradigma considera a consciência como elemento central para enfrentar as feridas herdadas, tanto pessoais como as que resultam de séculos de injustiça e divisão. Imagine sistemas políticos que não funcionem como um jogo de poder, mas sim como um verdadeiro ato de cuidado pela humanidade – acredito que a política deveria ser o maior ato de amor. Com a evolução da consciência, temos a capacidade de transformar as estruturas de liderança, alinhando-as com os valores de empatia, compaixão e integridade. Esta nova visão permite que a política deixe de ser um campo de interesses individuais e passe a nutrir o bem-estar coletivo. Além disso, vejo a introdução do tema da consciência nos sistemas educativos como uma mudança essencial, onde as crianças aprenderiam a reconhecer as suas emoções como naturais, podendo escutá-las e trabalhar com elas. Ensinar às crianças que os seus pensamentos não as definem e que representam apenas uma camada superficial da sua essência permite que compreendam o poder que têm de transformar esses pensamentos. Esta mudança educativa é um passo fundamental para o desenvolvimento de gerações futuras mais equilibradas e com uma qualidade de vida enriquecida. Esta é a minha visão de futuro e a razão pela qual fundei o projecto “Sacred Forest” – unindo a regeneração do planeta à cura do ser humano. É um projeto global que começa na Amazónia Peruana, que é também a minha casa há 15 anos. Neste momento temos 167 hectares de terra dos quais somos guardiões. Em breve teremos nessa terra um centro de cura onde todas as pessoas serão bem vindas para processos de evolução com e sem psicadélicos naturais e uma parte da terra será deixada intacta e ninguém poderá entrar, para que a natureza possa florescer sem se sentir ameaçada, para que os jaguares possam regressar. Será também o lugar onde serão iniciados estudos científicos para comprovar aquilo que tenho visto ao longo dos anos, combinando a espiritualidade e a ciência para benefício do ser humano. E no futuro este projeto será replicado – na Ucrânia, onde trabalhei 15 anos, como um statement de paz e esperança, em Portugal e noutros países. Este é o legado vivo que quero deixar para as futuras gerações, templos para a vida, para a consciência… relembrando que tudo e todos somos sagrados, que nós somos os verdadeiros altares e a vida é a cerimónia para a qual todos somos convidados.