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Catarina Jerónimo explica-nos o que é a pedagogia Montessori

Desenvolvida pela médica e pedagoga Maria Montessori, inicialmente como pedagogia científica, a pedagogia Montessori caracteriza-se por proporcionar vários níveis de independência, autonomia, liberdade com limites e acima de tudo, respeito revolucionário pela criança.

Centrada no desenvolvimento natural da criança, consiste numa pedagogia de ensino assente essencialmente em três pilares: o ambiente preparado, o adulto preparado e os materiais.

Catarina Jerónimo e Maria Sousa são duas mães apaixonadas pela abordagem de educação proposta por Montessori e pelo trabalho pessoal que a sua aplicação implica. Fundadoras do Jardim da Descoberta, organizam eventos Montessori nacionais e internacionais e são consultoras nesta área.

Catarina Jerónimo e Maria Sousa, Fundadoras Jardim da Descoberta

Catarina Jerónimo (à esquerda) e Maria Sousa (à direita), Fundadoras Jardim da Descoberta

Para percebermos as vantagens para a criança e para os pais deste tipo de pedagogia, conversámos com Catarina Jerónimo. 

No que é que consiste a Pedagogia Montessori?

Consiste na abordagem pedagógica desenvolvida por Maria Montessori. Nascida em 1870 e uma das primeiras mulheres a formar-se em Medicina em Itália, dedicou a sua vida a observar com suporte científico crianças de todas as partes do mundo e contextos. Dessa observação e dedicação, Maria Montessori concluiu que desde o nascimento até à maturidade as crianças atravessam diferentes planos de desenvolvimento, buscando em cada fase um tipo de independência específico. Em cada plano a natureza promove o surgimento de características e necessidades que conduzem a criança no seu processo de construção de um adulto independente e pronto a integrar a sociedade. Nesse sentido, Montessori estruturou uma abordagem onde o adulto preparado, o ambiente preparado e os materiais vão especificamente ao encontro dessas especificidades internamente procuradas pela criança em cada momento.

Mas não só. Tendo atravessado um clima de forte conturbação social, com duas guerras mundiais e diversas crises humanitárias, além do seu especial interesse pelos mecanismos de desenvolvimento humano, compreendeu não só que os contornos culturais de educação eram totalmente desajustados da verdadeira natureza e necessidades da criança, como também que essa desadequação era a origem de todos conflitos e crises humanitárias. Defendeu, assim, a importância de uma reforma construtiva social, de uma verdadeira ciência da paz, a qual precisa de assentar numa visão totalmente renovada da infância, rumo a uma nova Humanidade. Uma educação para a Paz.

Quais são as suas vantagens?

A maior e mais evidente vantagem da abordagem Montessori é o permitir o florescimento do potencial que cada nova criança traz ao mundo. Ao conhecer a criança e o seu processo natural de desenvolvimento, e ao acompanhar individualmente cada uma tendo em conta os seus interesses, ritmos e individualidade, então permite-se que cada uma ganhe consciência do seu único potencial e o prossiga.

Por outro lado, toda abordagem tem por suporte uma “educação para a paz”. A título exemplificativo, nas salas Montessori podemos observar inúmeras características que reproduzem e promovem a réplica de uma vida social pacífica. A heterogeneidade das idades, a existência de apenas um material de cada, o estabelecimento de limites claros e intransponíveis no que toca ao bem-estar dos demais e do ambiente, são aspetos que vão muito além de uma vivência pacífica unicamente em sala de aula. São sim aspetos que permitem às crianças integrar em si mesmas valores essenciais à paz, tais como a tolerância, o respeito, a cooperação, a liberdade, a verdade, que levarão para a vida.

Além de todos estes aspetos relacionados com a educação para a paz, a abordagem Montessori traz benefícios em termos de desenvolvimento cognitivo, emocional, social e espiritual, que têm vindo a ser comprovados cientificamente: capacidade de tomar decisões com consciência nas suas consequências, capacidade de concentração, de opinião pessoal e de espírito crítico, desenvolvimento da disciplina necessária à verdadeira liberdade, sentido de justiça, autocontrole e consciência, criatividade, independência, autodisciplina, amor pela aprendizagem, responsabilidade, autoconfiança, automotivação, respeito pelos demais e pela Terra, cooperação, entre muitos outros.

E os principais objetivos?

Podemos referir dois objetivos individualizáveis, mas indissociáveis. Por um lado, disponibiliza técnicas de aprendizagem que procuram interrelacionar e harmonizar atividade, liberdade e individualidade da criança em cada momento do seu processo de desenvolvimento, através de uma abordagem pedagógica que se vai adaptando, através dos materiais, do ambiente preparado e do adulto preparado, aos diversos planos que integram este processo. Por outro lado, esta abordagem pedagógica que promove um respeito revolucionário pela criança, tem como consequência direta um futuro mais promissor. A educação de uma forma que potencia a integração dos valores que são essenciais às alterações que são urgentes no nosso mundo.

Quais são os principais pilares?

Podemos dizer que existem três grandes pilares sobre os quais a abordagem Montessori ganha vida: o adulto preparado, o ambiente preparado e os materiais.

Para a aplicação das bases de Montessori é importante que o ambiente esteja preparado para a criança que o frequenta. Para isso vão sendo trabalhadas gradualmente questões relacionadas com a acessibilidade e a independência. Por outro lado, Maria Montessori desenvolveu diversos materiais que ajudam a criança a adquirir diversas competências específicas tendo em conta a fase de desenvolvimento em que se encontra. São materiais que foram desenvolvidos e melhorados através de anos de observação, e que são essenciais numa sala de aula Montessori. No entanto, as especificidades e fundamentos dos materiais (tais como o isolamento da dificuldade, o autocontrole do erro, a textura, etc.) e da sua disponibilização (ordem, beleza, rotação) podem ser tidos em consideração na disponibilização de brinquedos em quaisquer outros ambientes.

Por fim, o adulto que acompanha esta criança também tem de estar preparado, compreendendo as suas fases de desenvolvimento, as suas necessidades em cada momento e acima de tudo, estar preparado para deixar esta criança ser independente nas suas aprendizagens.

Se falarmos em sala de aula todos estes pilares apresentam igual ordem de importância, no entanto, se falarmos em ambiente de casa temos o adulto preparado como o mais importante, designadamente no seu papel de criação de um ambiente físico e humano que respeite a criança no seu processo de desenvolvimento.

Qual é o papel dos adultos nesta pedagogia?

Os adultos não são responsáveis pelas aprendizagens da criança ou pelo seu desenvolvimento. A verdade é que a natureza provê as crianças com tudo o que elas precisam para construir, em si e por si, todas as aprendizagens conducentes à sua plena autonomia. Tudo o que precisam é de encontrar um ambiente físico e humano no qual possam encontrar oportunidades de experimentar e de aprender todas as dimensões que fazem parte da existência.

Maria Montessori evidenciava a importância da preparação do adulto. Esta preparação deverá ser, por um lado, técnica, no sentido do seu necessário trabalho de aprofundamento e estudo da verdadeira natureza da criança em cada momento, das suas necessidades, características, para que a possa guiar e seguir, ser um protetor dos seus períodos de concentração, um observador atento pronto a remover eventuais obstáculos que se possam estar a colocar no caminho da criança e a introduzir as necessárias alterações nos materiais e ambientes para que possa prosseguir com esse crescimento.

Por outro lado, surge a chamada preparação espiritual do adulto, relacionada com a necessidade de quebrar com o ciclo de regresso à sua própria infância na hora de aplicar esse conhecimento, sobretudo nos momentos mais difíceis.

“A preparação para a educação é um estudo de si mesmo”. O aprofundamento dos planos de desenvolvimento da criança e de todo o seu impacto, conduzem a uma compreensão do impacto que a nossa própria infância teve em nós. Esta consciência abre as portas para o trabalho interior que é necessário fazer para quebrar com os padrões que queremos deixar de reproduzir, rumo a uma educação para a paz.

Por fim, não podemos falar em “adulto preparado”, mas sim em “adulto em preparação”, pois este é um trabalho para a vida. Um trabalho que exige uma enorme autocompaixão e congratulação por todas as vezes em que conseguimos identificar os nossos gatilhos e fazer diferente.

O que é um ambiente Montessori?

Podem existir dois ambientes, o ambiente de casa e o ambiente de escola. Quando começamos a estudar e a procurar aplicar esta pedagogia nas nossas casas, Montessori acaba por se tornar um estilo de vida, representativa de uma nova forma de ver as crianças e a infância. Nunca é um dos objetivos transformar uma casa numa escola. Quando falamos em ambiente de casa falamos de uma casa adaptada à criança, onde a criança tem o que precisa ao seu alcance, onde pode circular pela casa de forma livre, sem perigos, e onde tem espaço para desenvolver as suas aprendizagens ao seu ritmo e sentir-se como digna de confiança. Por exemplo, a criança deve ser capaz de beber água ou comer uma peça de fruta sempre que sentir essa necessidade. A criança tem ao seu dispor os utensílios que já é capaz de utilizar para o seu cuidado pessoal. É um ambiente que deixa de ser preparado por adultos para adultos, e que passa a considerar e acolher as reais necessidades da criança.

Em contexto de sala de aula, o ambiente Montessori representa as salas Montessori, repleta da organização, áreas de atividade, ordem, princípios e dos materiais necessários a cada plano de desenvolvimento.

Em que idade é que começa a ser colocada em prática esta pedagogia?

A abordagem desenvolvida por Montessori e pelos seus colaboradores abrange a vida humana desde o período da conceção, altura em que se inicia a nossa história de vida.

A gravidez é o primeiro ambiente preparado do bebé, durante o qual todos os seus sentidos acabam por ganhar vida. É, sobretudo, um ambiente onde acontece uma quantidade imensurável de desenvolvimento físico e psíquico, o qual é diretamente influenciado por inúmeros fatores, tais como a saúde da mãe, mas também a sua atitude de aceitação para com aquele bebé.

Maria Montessori defendia a criação da figura do Assistente da Infância. Uma pessoa especialmente preparada para acompanhar a mãe e o bebé durante o nascimento e os primeiros meses de vida, por considerar um período ao qual deve ser dada a máxima proteção, perante o impacto definitivo que representa. Durante o primeiro ano a mãe e o bebé são marcados pela forma como decorre o nascimento, como atravessam o período simbiótico (primeiras sete a oito semanas de vida), como se processam as “crises de desenvolvimento” (nascimento, alimentação, desfralde), de que forma o movimento e a linguagem têm espaço para se desenvolver, entre tantos outros aspetos aos quais deve ser dada atenção.

Compreender o incrível desenvolvimento que ocorre durante o primeiro ano é talvez uma das mais importantes preparações que uma família pode encetar para a chegada de um bebé. Essa compreensão irá permitir prepararem-se para acolher um novo membro da família e suportar as suas necessidades, com a adaptação do ambiente, com a disponibilização de materiais simples e adequados, e com a proteção da relação fusional entre a mãe e o bebé, com resultados surpreendentes na construção de uma personalidade confiante do seu valor e das suas capacidades.

Existem em Portugal quantas escolas, mais ou menos, a praticar este tipo de pedagogia de ensino? 

Este é um movimento que está a crescer em Portugal e começou há relativamente pouco tempo. Existem vários projetos novos a nascer, mas podemos dizer que hoje em dia existem cerca de dez escolas Montessori em Portugal. Alguns exemplos são a Escola Montessori do Porto, a Kairos Montessori (Cascais) e a Eden – Montessori Internacional School (Albufeira). Merece ainda referência o projeto desenvolvido pela Escola Montessori do Porto que levou Montessori para uma escola pública, em Matosinhos.

A existência de escolas Montessori para mais crianças e para mais faixas etárias é um processo que tomará o seu tempo. Até lá, resta-nos, a todos os que lidamos com crianças, munir-nos do conhecimento e trabalho que podem mudar a vida destas crianças e, assim, da própria Humanidade.

Se ficou interessada em aprender mais sobre a pedagogia Montessori, saiba que no dia 29 de agosto, às 18h, a Academia Mamãs Sem Dúvidas vai realizar uma sessão online gratuita sobre esta temática focando a forma como os casais devem introduzir a pedagogia Montessori na gravidez e nos primeiros meses de vida do bebé. Inscreva-se aqui.

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