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Em Portugal, estima-se que 10% das mulheres em idade fértil sofrem de endometriose

Raquel Prates anunciou recentemente que iria ser submetida a uma cirurgia de histerectomia total (que consiste na remoção do útero), na sequência de vários tratamentos para a endometriose.

Esta é uma doença desconhecida para a maioria do público em geral, mas que impacta a vida de muitas mulheres.  Em Portugal, estima-se que 10% das mulheres em idade fértil sofrem de endometriose.

No sentido de esclarecer as dúvidas e apontar sinais e sintomas da doença, cujo diagnóstico nem sempre é fácil e rápido e impacta negativamente a qualidade de vida da mulher, conversámos com Filipa Osório, especialista em Ginecologia-Obstetrícia.

Dra. Filipa Osório

Filipa Osório

O que é a endometriose?

Para percebemos o que é endometriose, começo por explicar o que é o endométrio – que corresponde ao tecido que reveste a cavidade uterina e que sofre alterações cíclicas ao longo do mês, proliferando e crescendo até iniciar a sua descamação que se traduz pela menstruação.

Quando este tecido migra para fora do útero e se implanta noutros locais, vais sofrer as mesmas alterações cíclicas -prolifera, cresce e “menstrua”, em qualquer parte do nosso corpo

Dependendo do local, podem-se manifestar de diferentes formas, seja por dor pélvica ou infertilidade, podendo ser identificadas sobre a forma de quistos, aderências ou nódulos.

A que sinais devemos estar atentas?

A endometriose manifesta-se maioritariamente por dor intensa (dor associada à menstruação, dor ao evacuar, dor ao urinar ou dor nas relações e por vezes dor na ovulação), nalguns casos por infertilidade ou achados em exames de rotina.

“Quando uma mulher tem dor menstrual (dismenorreia) que interfere com o seu dia a dia, impedindo-a de fazer uma vida normal, significa que deve ser investigada e deve procurar ajuda diferenciada para perceber qual a causa da dor e diagnosticar ou excluir endometriose.”

Quais são as consequências desta doença?

Esta é uma doença que afeta as mulheres em idade fértil e que se manifesta essencialmente por dor incapacitante, com interferência na vida pessoal e profissional da mulher, afetando a sua qualidade de vida.

Por outro lado, também pode associar-se a infertilidade, não só pela distorção anatómica provocada pela doença, como pela própria inflamação causada. Sabe-se que cerca de 1/3 das mulheres que têm endometriose precisam de ajuda para engravidar, seja ela cirúrgica ou através de uma consulta de infertilidade.

Sendo uma doença crónica que afeta as mulheres durante a sua vida reprodutiva, é fundamental um diagnóstico precoce para uma melhor orientação e preservação da fertilidade. Infelizmente, ainda existe um franco atraso no diagnóstico – em média de 7 a 10 anos – porque ainda é comum dizer-se que ter dor na menstruação é normal ou que passa depois de uma gravidez, ou mesmo que a mãe e a avó também tenham, acabando por desvalorizar a gravidade da dor.

“Por outro lado, torna-se fundamental dar mais formação aos cuidados de saúde primários de modo a saber ouvir a queixas, investigar, desconfiar e orientar estas mulheres para centros de referência.”

Quais seriam as vantagens de um diagnóstico e tratamento precoces da endometriose?

Ter um diagnóstico precoce da doença permite controlar atempadamente a evolução da endometriose. Permite diminuir o risco de evolução para doença grave com quadro de dor crónica incapacitante associado. Permite diminuir o risco de envolvimento intestinal, urinário ou de outros locais, bem como o risco de infertilidade, afetando severamente o bem-estar físico e emocional da mulher.

Permite controlar atempadamente os sintomas evitando as sequelas de uma vida com dor.

Possibilita o aconselhamento da doente a adotar hábitos de vida mais saudáveis e idealmente sob menos stress. Permite a orientação da doente para um centro de referência que a acompanhe ao longo das várias etapas da sua vida e da sua doença, atuando atempadamente e adequadamente quando necessário.

“Uma mulher com endometriose não tem que viver com dor. Deve ser diagnosticada precocemente e orientada corretamente de modo a ter qualidade de vida”

Que opções de tratamento existem?

Sendo uma doença crónica, temos que ensinar as mulheres a saber lidar com a doença e a controlar os sintomas, infelizmente ainda não existe um tratamento 100% eficaz. Neste sentido, podemos atuar de várias formas:

Hábitos de vida saudáveis – uma alimentação dita “anti-inflamatória” vai reduzir a inflamação pélvica e as queixas de dor; a redução dos níveis de stresse e a prática de exercício físico também são fatores importantes

Depois, cada caso é um caso! Cada doente tem que ser estudada particularmente e de acordo com os seus objectivos, as suas queixas e a gravidade da doença, é definido um tratamento (uma mulher com filhos e que procura qualidade de vida é diferente de uma mulher com dor e sem filhos que procura fertilidade e uma vida sem dor).

Dentro destas premissas, é importante salientar que

Se a mulher não apresenta contraindicação para uma terapêutica médica e não pretende engravidar – tem indicação para iniciar terapêutica hormonal, ou seja, iniciar uma pílula para atrofiar o endométrio que se encontra fora do útero de modo a tentar adormecer a endometriose e a controlar os sintomas, melhorando a qualidade de vida das doentes.

Se a mulher pretende engravidar, deve interromper a terapêutica hormonal e faz-se uma vigilância de sintomas e da doença durante as tentativas e até obter uma gravidez. Se a dor é incapacitante ou se a doença é agressiva e com envolvimento de órgãos (intestino, bexiga, ureter…) a cirurgia deve ser equacionada e discutida com a doente. Se a dor é controlável e a doença está estável, mas a doente não consegue engravidar – deve ser equacionada a avaliação por uma equipa de infertilidade.

No contexto atual, a mulher muitas vezes protela a gravidez para uma fase mais tardia da vida, e numa mulher com endometriose em que a inflamação da doença pode por si só deteriorar a reserva ovárica/ função ovárica ou pode haver mesmo envolvimento dos ovários e trompas pela endometriose – devemos cada vez mais e mais cedo alertar para a possibilidade de preservar óvulos – criopreservação. Seja pré cirurgia, seja porque apenas a mulher ainda não pretende engravidar, devemos cada vez mais falar precocemente sobre este tema.

“No fundo, o tratamento da mulher com endometriose deve atuar em várias dimensões de modo a restabelecer o bem-estar físico e psíquico da mulher”

É importante não só controlar a doença, mas também perceber as dúvidas e os objetivos da mulher de modo a estabelecer um plano de ação adaptado ao seu caso.

Porque é que é importante alertar as pessoas para esta doença? 

Ainda há muito desconhecimento sobre a existência desta doença. Alertar para a endometriose, divulgando os seus sintomas, permite a identificação de casos semelhantes, permite criar a dúvida nalgumas mulheres, levando-as a procurar ajuda diferenciada mais precocemente, com todas as vantagens que daí advêm.

Atualmente com os canais de informação e as redes sociais, a divulgação e o acesso à informação torna-se muito mais rápido, parecendo levar a um aumento de diagnósticos. Por outro lado, a vida da mulher atual é frequentemente pautada pela definição de uma carreira/ estabilização profissional, por um atraso no planeamento familiar, pelo stress e falta de tempo, por má alimentação… tudo fatores que podem desencadear e agravar um quadro subclínico de endometriose.

“Sabemos que a endometriose afeta 1 em cada 10 mulheres em idade fértil o que corresponde em Portugal a 350 mil mulheres – é fundamental alertar as pessoas para este problema”

Tem sido desenvolvido um trabalho de divulgação incansável por parte da Associação Portuguesa das Mulheres com endometriose em Portugal. É uma associação que prima não só pela divulgação, mas também pela orientação e apoio de todas as mulheres que a procuram. Nos dias de hoje fala-se mais de endometriose também pelo excelente trabalho que tem sido realizado pela Mulherendo.

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