… Isabel Saldanha, fotógrafa

Viagens

Aqui em casa, consomem-se viagens em prime time, papa-se muito Travel Channel e muito National Geographic, googla-se muito destino exótico, lambe-se muito atlas, pesquisam-se viagens de sonho, poupa-se para milhas, suspira-se por feriados e pontes, improvisam-se check lists, sonha-se com malas grandes e trolleys de rodinhas, acaricia-se o passaporte, desenham-se paisagens em folhas brancas, planeia-se em folhas soltas, sonha-se com vistos e carimbos. Destinos que me marcaram: Birmânia, China e a Bolívia.

Livros

Os livros também são viagens (sobretudo), com a vantagem deliciosa de estarem ao alcance das nossas mãos. Tenho livros que me marcaram mais do que pessoas, livros que tentei agarrar com força até ao fim e com os quais, quando fechei as abas, no virar da última página, tive o mesmo sabor a tristeza do fim de uma grande viagem. Partilho alguns daqueles que me acompanham: ‘A Montanha Mágica’ (Thomas Mann), ‘Todos os Nomes’ (José Saramago), ‘O Inverno do Nosso Descontentamento’ (John Steinbeck), ‘Amor em Tempos de Cólera’ (Gabriel García Márquez), ‘A Menina Manhosa’ (Mario Vargas Llosa), ‘Crime e Castigo’ (Dostoievski), ‘Os Maias’ (Eça de Queiroz), ‘Morreste-me’ (José Luís Peixoto), ‘Mau Tempo no Canal’ (Vitorino Nemésio), ‘Mensagem’ (Fernando Pessoa), ‘A Vida Não É Aqui’ (Milan Kundera), ‘A Pastoral Americana’ (Philip Roth), ‘A Metamorfose’ (Franz Kafka)… e tantos outros! Estes são só aqueles que me ocorrem, porque sei que, quando escrevo, na ponta da caneta, estão todos lá!

Comer & beber

Sempre gostei muito de comer e de beber. Das coisas que mais me lembro da minha infância, são as receitas da minha mãe, da minúcia talentosa que a definia na cozinha, da sua respiração compassada e do passo acelerado, com que ia e vinha da cozinha carregando pratos cheios e travessas coloridas, da forma como dispunha na mesa os pratinhos individuais de manteiga de alho caseira e o ‘poc’ abafado da rolha a soltar o vinho. Passávamos horas à mesa, diziam os mais velhos que “ali não se envelhecia”. Aprendi a degustar de pequenina, sabendo de antemão que de acelerar nada valia, porque era um pressuposto de boa educação que esperássemos uns pelos outros. Naquele palco estendido, eu desacelerava, descomprometia-me com a vida e aprendia que o sabor das coisas se apura na entrega absoluta do tempo que lhe damos.

Há pessoas que só aprendem mais tarde, quando a maturidade nos bate à porta e nos ensina de forma brusca, que há momentos simples que valem por todas as buscas perdidas da vida. Tive a sorte de ter descoberto, através da necessidade mais básica de existir, uma forma serena de desfrutar. Continuo a acelerar em quase tudo, no tempo que roubo ao sono, nas filas de trânsito, nas pequenas transgressões, a encurtar nas conversas redondas, a dispensar nas pessoas insípidas, mas, quando me sento à mesa, ou quando seguro um bom tinto, volto a ser aquela menina pequenina que não envelhece. O meu top? O Pinóquio: tem as melhores gambas ao sal e picapau delicioso; Mesón Andaluz, Travessa do Fado, para petiscar; Confraria de Lisboa, para comer sushi; e o meu refúgio no Alentejo, um pequeno monte onde assamos o bacalhau na lareira e se bebe como em poucos lugares.