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Relação entre Cancro do Endométrio e Obesidade! Verdade?

Artigo de Opinião de Dr. Henrique Nabais, Presidente da Secção de Ginecologia Oncológica da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Director da Unidade Multidisciplinar de Ginecologia Oncológica da Fundação Champalimaud

O cancro do endométrio (CE) desenvolve-se no revestimento interno do útero chamado endométrio e é o cancro ginecológico mais frequente nos países ocidentais, com especial incidência após a menopausa (75% dos casos). O risco cumulativo da mulher desenvolver CE , ao longo da sua vida, é na Europa de 1,9 e em Portugal de 1,3.

Prevê-se que até 2036, a incidência do CE em mulheres na pós-menopausa com 55 anos ou mais aumente em 6,5%.

Os sintomas mais frequentes e característicos do CE são a hemorragia vaginal anormal, nomeadamente alterações no padrão menstrual habitual e hemorragia pós-menopausa. Neste último caso é frequente a referência a um corrimento rosado muitas vezes descrito como “água de lavar carne”. Outras queixas menos específicas são a dor ou o desconforto na região pélvica. Estes sintomas permitem, na maioria dos casos, um diagnóstico precoce.

São vários os factores de risco associados ao desenvolvimento desta doença oncológica. Os mais importantes são o envelhecimento e a obesidade. Outros factores são, por exemplo, o aumento crónico dos níveis sistémicos de estrogénios (associado a várias condições como diabetes mellitus, síndrome dos ovários poliquísticos e dieta rica em gordura), idade precoce da primeira menstruação, idade tardia da menopausa, ausência de gestações, hipertensão arterial e algumas mutações genéticas (por exemplo as associadas ao síndrome de Lynch).

A obesidade é uma doença crónica, multifactorial, definida pela Organização Mundial de Saúde como a acumulação excessiva de gordura a partir de um Índice de Massa Corporal (IMC) ≥ 30. A prevalência da obesidade tem aumentado de maneira epidémica em todas as faixas etárias nas últimas quatro décadas e, actualmente, representa um importante problema de saúde pública. A obesidade constitui em si um factor de risco para diversas patologias, incluindo a diabetes mellitus tipo 2, a hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e alguns outros tipos de cancro como o do cólon, recto e mama.

A relação entre obesidade e cancro do endométrio está bem estabelecida sendo explicada por vários mecanismos que actuam de forma sinérgica, sendo os mais importantes:

  1. Aumento dos níveis de estrogénio: a gordura actua como uma fonte adicional de estrogénio, uma das  hormonas que interfere com a proliferação do endométrio e regulação do ciclo menstrual. Após a menopausa a principal fonte de estrogénio deixa de ser os ovários e passa a ser o tecido adiposo, por meio da ação da enzima aromatase que converte andrógénios em estrogénios. Na mulher obesa pós-menopausa ocorre uma elevação significativa da atividade desta enzima com aumento dos níveis de estrogénio circulante sem a oposição da progesterona, circunstância que se associa a uma estimulação do crescimento do endométrio e aumento do risco de CE.
  2. Inflamação: a obesidade também está associada a um estado de inflamação crónica de baixo grau. O tecido adiposo, especialmente o visceral, actua como um órgão endócrino que secreta diversas substâncias pró-inflamatórias como a Proteína C-Reativa (PCR), o Fator de necrose tumoral-alfa (TNF-α) e a Interleucina-6 (IL-6) que têm efeitos sistémicos como alterações no metabolismo da glicose e promoção da proliferação celular e da angiogénese, condicções importantes no processo de carcinogénese. Por outro lado, parece existir uma relação bidireccional entre estrogénio e inflamação. Altos níveis de estradiol podem modular a libertação de citocinas inflamatórias, enquanto a inflamação também pode aumentar a expressão de receptores hormonais e enzimas, como a aromatase. Este ciclo de retroalimentação cria um ambiente favorável ao desenvolvimento do cancro.
  3. Alterações hormonais e metabólicas: a gordura associa-se a outros desequilíbrios hormonais e metabólicos que criam um ambiente propício à carcinogénese.

A relação entre o cancro do endométrio e a obesidade é um excelente exemplo de como fatores de estilo de vida podem influenciar de forma significativa a saúde da população!

No entanto, as boas notícias existem! As mudanças no estilo de vida podem reduzir o risco oncológico!

Uma intervenção multifactorial a nível da literacia em saúde, da manutenção de um peso saudável com alimentação equilibrada e prática regular de exercício físico, são estratégias eficazes. A prática de exercício físico regular tem um papel importante não só na prevenção do cancro, mas também na pré-habilitação para a realização dos tratamentos e na reabilitação física e emocional pós-tratamento. Algumas evidências sugerem que os sobreviventes de cancro que efectuam exercício físico reduzem a probabilidade de recorrência e maior sobrevida.

Por fim, salientar a importância da vigilância médica regular e acessível em tempo útil como elementos cruciais na prevenção, diagnóstico precoce e tratamento do CE.


Henrique Nabais

Presidente da Secção de Ginecologia Oncológica da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Director da Unidade Multidisciplinar de Ginecologia Oncológica da Fundação Champalimaud

 

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