

Esqueça as princesas à espera de resgate – o mundo precisa de rainhas que arregaçam as mangas e moldam a própria história. Se você está cansada de esperar que o universo conspire ao seu favor, ajuste a coroa e comece a escrever o seu próprio destino.
As princesas: essas criaturas sempre tão encantadoras, sempre tão à espera. À espera de quê, exactamente? Que a fada madrinha dê um jeitinho? Que o príncipe surja triunfante e resolva os problemas que a vida insiste em empilhar? Que o dragão desista do cerco ao castelo por puro tédio? Seja como for, a verdade é inescapável: as princesas, por mais deslumbrantes que pareçam, não mudam o mundo. Elas suspiram. Elas esperam. Elas fantasiam. Mas agir? Ui, agir é trabalho de rainha.
Porque, convenhamos, enquanto a princesa sonha com o “felizes para sempre”, a rainha está ocupada a reescrever o decreto e a reorganizar o reino. O mundo não é transformado por quem se limita a esperar um milagre; ele é moldado por quem tem coragem de governar a própria história. Ser rainha não é ser fria, nem dura ou insensível. Nada disso. Ser rainha é abandonar o conto de fadas e aceitar o convite para um papel bem mais exigente: o de autora da sua vida. É abraçar a complexidade de existir, com toda a sua luz e sombra, com os momentos sublimes e os inevitáveis tropeços, enquanto se olha no espelho e se proclama: “Basta de esperar. A (minha) história começa agora!”
Perguntar-me-á com toda a legitimidade e inocência: mas afinal, o que nos torna rainhas? A consciência de que a vida não é um conto de fadas. Que não há príncipes perfeitos, nem sapatinho de cristal que caiba sem calos nem pés doloridos. Que o “felizes para sempre” é uma construção, não um presente embrulhado em papel dourado.
As rainhas não têm medo de se mover. Elas sabem que a vida é um tabuleiro de xadrez onde permanecer imóvel é um luxo que ninguém pode pagar. As princesas, por outro lado, são muitas vezes como peões – bonitinhas, úteis, mas facilmente sacrificadas. Já a rainha… Ela é poderosa, ela é livre, audaciosa, capaz de se mover em todas as direcções, seja para proteger o que importa ou para conquistar o que deseja. A diferença é clara: enquanto as princesas sonham com um destino idealizado, as rainhas fazem escolhas. E essas escolhas, por mais difíceis que sejam, são a verdadeira força que move o mundo.
E aqui estamos, em pleno século XXI, num mundo onde as princesas já não habitam castelos, mas sim redes sociais. Elas vivem nos ‘feeds’ impecáveis, nos ‘reels’ infalíveis, nas fotografias filtradas, nos corpos adulterados, nas vidas fabricadas para parecerem perfeitas enquanto escondem olheiras, borbulhas, inseguranças e frustrações. E o dragão? Ele também mudou. Hoje, o dragão é a comparação constante, o medo de falhar, o perfeccionismo que nos paralisa. É mais fácil culpar o dragão externo do que enfrentar o monstro que vive dentro de nós. É mais fácil ficar na torre dourada da zona de conforto, convencendo-nos de que é o mundo que precisa de mudar, e não nós.
Repare. O cérebro é uma máquina eficiente, mas preguiçosa. Ele quer gastar o mínimo possível de energia para garantir a sua sobrevivência. Note bem, sobrevivência, não felicidade. E como a mudança exige esforço, ela é percebida como uma ameaça. O seu cérebro, então, acciona a auto-sabotagem para mantê-la na zona de conforto, onde tudo é previsível – mesmo que insatisfatório.
Então, a auto-sabotagem é como aquele amigo da onça que se abanca no seu sofá e diz: “Mas para quê sair de casa e correr o risco de falhar? Vamos pedir uma pizza e fingir que está tudo bem.”
Contudo, a auto-sabotagem não é uma vilã sem coração. Não é uma bruxa má a rir às gargalhadas enquanto arruína os seus sonhos de forma maquiavélica. Nada disso. Ela é, na verdade, um mecanismo de auto-protecção – disfuncional, mas bem-intencionado.
Veja, a auto-sabotagem serve para preservar o status quo, ou seja, a zona de conforto da sua identidade. Mesmo que essa identidade esteja insatisfeita ou em frangalhos. Por quê? Porque as mudanças profundas exigem energia, e o cérebro é como aquele amiguinho forreta que detesta gastar. Ele quer a maior economia possível – seja de esforço físico, emocional ou mental.
Mas toda essa protecção tem um custo. Ela prende-a no ciclo do “quase lá”, onde os sonhos são eternamente adiados porque, bem, “não era o momento certo,” ou “o trânsito estava terrível,” ou “o universo ainda não conspirou a meu favor”, já para não falar que amiúde “o mercúrio está retrógrado”…
Se você sente que a vida está a segurá-la pelo colarinho e a arrastá-la pelas esquinas da existência como um saco de batatas, é hora de uma conversa séria. Talvez seja desconfortável ouvir isto, mas o motivo pelo qual você está nessa situação não é o universo, nem o azar, nem a sua sogra. A verdade é mais simples e mais dolorosa: você.
Calma, não me odeie tanto assim. Isso não é um ataque pessoal. Pelo contrário, é um lembrete poderoso. Porque se a sua dor vem de si, adivinhe só? A chave para sair dela também está aí dentro.
A auto-sabotagem é o castelo confortável onde as princesas se escondem. Porque, convenhamos, é assustador sair de lá. É doloroso admitir que, muitas vezes, somos nós que construímos as correntes que nos prendem. Mas o que as princesas esquecem é que esse castelo, embora seguro, é também uma prisão. É sufocante. E enquanto elas continuam a suspirar para o céu, à espera de algo ou alguém que as resgate, as rainhas decidem pegar na espada e enfrentar o que for preciso. Mesmo que estejam a tremer. De dor, de amor, de tudo ao mesmo tempo. Mesmo que não saibam exactamente para onde estão a ir
O nosso amigo “Ego” geralmente constrói justificativas brilhantes, quase poéticas, para mascarar o medo do fracasso. Ele é o mestre dos disfarces. E, claro, preservar o ‘status quo’ significa que você não terá que confrontar algumas verdades incómodas, como o facto de que o sonho de ser um(a) grande escritor(a), empresário(a), atleta ou [insira o sonho aqui] exige, além de talento, muito trabalho. Confrontar isso dói. Então, a auto-sabotagem entra em acção. Eis alguns exemplos clássicos:
- “Não consegui porque escolhi um dia péssimo.”
- “Eu poderia ter sido incrível, mas nunca tive as condições certas.”
- “Claro que estou solteiro(a). Homens/mulheres são todos(as) uns idiotas mesmo.”
- “Se a vida quiser me dar algo bom, que me traga até aqui. Eu não corro atrás.”
Parece inofensivo, mas cada uma destas desculpas reforça a ideia de que você não precisa sair da sua zona de conforto. Afinal, para quê correr o risco de falhar e, com isso, destruir a imagem inflada que você tem do seu “eu potencial”? Melhor ficar onde está.
Essas narrativas confortam, mas também paralisam. Elas criam a ilusão de que você está no controlo, quando, na verdade, está a ser controlada pelo medo de encarar a realidade. Afinal, quem seremos sem essas histórias que contamos para nós mesmas?
Sim, a coroa pesa. Carregar a responsabilidade pela própria vida é um fardo. Ser rainha implica ter de fazer escolhas difíceis, sacrifícios reais e, muitas vezes, a solidão de quem opta por um caminho menos percorrido. Mas, ao mesmo tempo, é libertador. Quando deixamos de esperar que a vida nos entregue o que desejamos e começamos a construir o que queremos, percebemos que a liberdade vale infinitamente mais do que a ilusão de segurança.
As rainhas sabem que a perfeição é uma miragem. Elas entendem que o medo não desaparece, mas pode ser domado. E sabem que fracassar não é o fim, mas um capítulo essencial na história de quem tenta. Porque, no final, a vida não é sobre sermos salvas; é sobre salvar-se. É sobre transformar dores em dons, fra(n)quezas e vulnerabilidade em força, desafios em aprendizagens, sonhos em realidade.
No final das contas, a auto-sabotagem não é a sua inimiga. É apenas uma parte de si mesma que precisa de atenção, de cuidado, de transformação. Mas só você pode fazer isso.
Se você quer mesmo romper com o ciclo da auto-sabotagem, precisa começar por ser brutalmente honesta consigo mesma. Vamos lá:
- Reconheça os seus padrões. Quando você procrastina, foge ou racionaliza, o que está realmente a evitar?
- Identifique o que você tem medo de perder. Talvez seja o medo de descobrir que não é tão boa quanto acredita. Ou que talvez seja o medo de perder a segurança que as suas desculpas oferecem.
- Visualize o que você quer. Não como um sonho distante, mas como algo que começa com pequenas acções agora.
Agora, diga-me: o que é que você está disposta a fazer para transformar a sua vida?
Então, aqui fica a questão que só você pode responder-se: vai continuar como princesa, à espera que algo mude, ou vai ajustar a coroa, arregaçar as mangas e começar a reescrever a sua história? Porque ser rainha não é sobre saber tudo ou ter todas as respostas. É sobre começar, é sobre continuar, e é sobre ter a coragem de recomeçar ou de acabar, se for necessário.
E sabe o que é mais incrível? Você não precisa de um reino inteiro para dar o primeiro passo. Ele começa com esse que aparenta não ser mais do que um cliché (eu sei), esse famoso ou infame “aqui e agora”. Com o momento em que você decide que já está farta de desculpas, que já chega de auto-sabotagem, já chega de esperar. É aqui, neste instante, que o mundo começa a mudar – porque você decidiu mudar.
A vida não é sobre evitar a dor, mas sobre crescer através dela. Parar de se sabotar é um acto de amor-próprio e inteligência emocional. É decidir que você merece uma vida plena, mesmo que isso exija trabalho, esforço e, sim, alguns tropeções pelo caminho.
E aqui está o ponto principal: a auto-sabotagem não é sobre fracasso, mas sobre medo do fracasso. E, mais profundamente, medo de perder a identidade construída em torno de uma narrativa confortável.
No final das contas, a escolha é sua: continuar refém das suas desculpas ou romper as correntes e seguir em direcção ao desconhecido. O desconhecido assusta, mas também é o único lugar onde o novo pode surgir.
As princesas sonham com finais felizes. As rainhas criam realidades felizes. Ajuste a sua coroa (lidar com uma perda, recomeçar após o fracasso, dizer não a algo que já não serve, etc.), minha cara, e lembre-se: o mundo não vai mudar sozinho. Ele está à espera da sua majestade.
Sara Ferreira
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