No início de setembro, os fãs de Only Murders in the Building, série da plataforma de streaming Disney+, regressaram ao icónico Arconia, em Nova Iorque, para desvendarem mais um homicídio. Na quinta temporada, Charles (Steve Martin), Oliver (Martin Short) e Mabel (Selena Gomez) unem esforços para descobrir o responsável — ou os responsáveis — pela morte do porteiro Lester (Teddy Coluca). Este mistério trouxe uma nova vida ao prédio que, mais do que uma locação, se tornou numa personagem central da narrativa, graças ao trabalho do departamento de design de produção, liderado por Patrick Howe, Production Designer da série.
Patrick Howe, Production Designer da série “Only Murders in the Building”
Responsável por criar ambientes onde as histórias ganham vida, Patrick Howe revelou, numa entrevista à LuxWoman, o seu dia a dia, o processo criativo por trás da conceção dos cenários e os desafios da quinta temporada desta aclamada produção.
O que faz um Production Designer? E, no seu caso, na série Only Murders in the Building, como é um dia típico de trabalho?
Bem, eu diria que o dia típico de um designer — partindo do princípio de que as filmagens estão em andamento, como a meio da temporada, por exemplo — começa, geralmente, com o encontro com o elenco e a equipa de filmagem no estúdio. É o que chamamos de “abrir os cenários”, seja num set ou numa locação. Assim, o início do meu dia consiste em garantir que o primeiro cenário está pronto para a câmara e para o ensaio, permanecendo depois com a equipa de filmagem e com o elenco dessas cenas, acompanhando o primeiro ensaio do bloco inicial de sequências e certificando-me de que o realizador, o showrunner, o diretor de fotografia e todos os outros estão satisfeitos e em sintonia. Só depois posso afastar-me para confirmar se o cenário, a decoração e os adereços estão a funcionar como tinha previsto. Caso contrário, faço alterações e tomo notas, tal como qualquer outro chefe de departamento.
Depois, posso seguir com o resto do meu dia, que envolve acompanhar a filmagem desse cenário e repetir o mesmo processo se houver dois ou três outros cenários ou locações ao longo do dia — o que é comum. Dedico também parte do tempo que sobra à preparação das filmagens do dia seguinte, verificando se o cenário em que vamos filmar está devidamente decorado e pronto. Parte do meu dia pode ainda ser passada fora do edifício, numa carrinha de scouting de locações, com o realizador do episódio seguinte, o produtor e o gestor de locações, à procura de novos locais para as próximas filmagens.
Nas horas que restam do dia, costumo ficar no meu escritório, a desenvolver uma planta preliminar, a pesquisar ou a trabalhar com os decoradores no planeamento de episódios futuros. Normalmente, distribuo o tempo por cada uma dessas áreas — um pouco para supervisionar a abertura dos sets, outro tanto para investigação e esboços de futuros cenários, com base no guião preliminar que já li. E, como disse, também há o scouting de locações ou o trabalho com os colegas do departamento artístico: os assistentes de direção de arte, o diretor de arte e as equipas de oficina.
Durante o dia, aproveito ainda para passar pelas oficinas de construção e pintura e reservo algum tempo com os decoradores e aderecistas para verificar tudo o que está em preparação para o dia seguinte ou mesmo para a semana seguinte. Tentamos escalonar a produção dos novos cenários e, embora o agendamento dependa, antes de tudo, da disponibilidade dos atores — que é a prioridade principal —, procuramos distribuir o ritmo de produção de forma equilibrada, para que todas as equipas consigam ter o seu trabalho pronto em tempo razoável.
O apartamento de Charles. Créditos: Disney/Patrick Harbron
Quando começa uma nova temporada, os seus primeiros passos passam pela procura de novos locais?
Sim, os meus passos iniciais começam oito ou nove semanas antes das filmagens e é nessa altura que tenho reuniões com o showrunner e o meu produtor para discutir verbalmente alguns dos novos cenários e locações pretendidos. São nessas reuniões iniciais com o showrunner que aprendo mais sobre a sua intenção relativamente ao que está a ser escrito, e é quase exclusivamente com base na descrição dele — do propósito das cenas e do que ele espera alcançar com elas — que faço quase todas as minhas escolhas. Isso permite-me perceber o ambiente, definir o tom e criar a ambiência para os diferentes cenários ou locações. O mesmo se aplica no caso de ser uma locação: decidimos quantas cenas vão ser escritas para aquele local e, se forem muitas, optamos por construir um cenário; caso contrário, tentamos encontrar uma locação, pois é mais económico.
Que outros primeiros passos são necessários?
Outra parte é fazer esboços preliminares, plantas e pesquisas, que depois mostro ao showrunner como ideias para aquele cenário. Ele aprova ou não e, caso não aprove, voltamos ao início do processo, que se repete ciclo após ciclo, cenário após cenário e episódio após episódio.
Sendo assim, quanto tempo demora todo o processo?
Normalmente, no início, posso dedicar um pouco mais de tempo porque estamos a planear as coisas maiores e mais complicadas da temporada, ou as que se conhecem para os primeiros episódios. Isso pode significar três ou quatro semanas de reuniões, depois o meu trabalho de pesquisa, esboços e desenvolvimento dos cenários pela minha equipa, seguido da construção, pintura e decoração. O período mais longo que pode ocorrer é de cerca de quatro semanas, mas, geralmente, tudo isso é condensado ou consolidado num período de cerca de uma semana, ou aproximadamente cinco dias úteis. Por vezes, alguns cenários são idealizados, construídos, pintados e decorados em apenas cinco, seis ou sete dias úteis.
O Casino. Créditos: Disney/Patrick Harbron
Na quinta temporada de Only Murders in the Building, os protagonistas regressam ao Arconia, em Nova Iorque. Que diferenças encontramos?
A diferença mais significativa é que o trio descobre uma outra parte do Arconia que nunca tinha conhecido antes, que é aquele casino subterrâneo de jogos, que vemos pela primeira vez no episódio um. Esse foi um cenário grande para preparar, planeado para conter uma certa quantidade de conteúdo para toda a temporada. Além disso, também construímos um cenário para o átrio do Arconia. Embora o átrio já tivesse sido uma locação nas temporadas anteriores, nesta temporada íamos filmar lá com tanta frequência que me encarregaram de replicar o local real e transformá-lo num cenário, o que foi bastante bem-sucedido e ficou realmente parecido com o espaço real. Fiquei muito satisfeito com o resultado.
Mais tarde, a meio da temporada, os espetadores vão conhecer o apartamento no último andar com uma nova residente. Althea, interpretada por Beanie Feldstein, é a ocupante deste ano, e o apartamento está decorado com um estilo que combina com a sua personagem — jovem, divertida e brincalhona.
Temos ainda algumas outras locações ao longo da temporada. Por exemplo, aparece uma das casas de um dos bilionários no episódio sete, creio eu. E há ainda outras coisas, incluindo uma lavandaria que é parte integrante da história no início e no fim da temporada.
Todas as temporadas, a penthouse é ocupada por um novo integrante. Referiu que a decoração desta é jovem, divertida e brincalhona. Foram essas as suas inspirações?
Tive, mais uma vez, a oportunidade de conversar com o nosso showrunner sobre o tom que ele queria transmitir naquele espaço. Os aspetos que pretendíamos mostrar eram que ela era uma jovem, uma cantora pop de muito sucesso. Estabelecemos certos vocabulários para ela, tanto na roupa como no espaço. A Dana, a figurinista, desenvolveu elementos para o guarda-roupa dela que eram muito fantasiosos e meio ilógicos — um estilo de moda propositalmente contrário às normas. A penthouse procura ser contemporânea, com uma paleta de rosas, preto, branco e algumas tonalidades prateadas. Optámos por algumas obras de arte pop, que também funcionavam quase como peças promocionais para a personagem, como álbuns de ouro emoldurados ou fotos de sessões promocionais da artista Althea. Tudo isso ajudou a criar um espaço vibrante e juvenil. O sentido de moda dela é homenageado com um sapato de salto alto gigante como objeto de arte no cenário, que tem cerca de um metro e sessenta de altura — mais alto do que ela.
O apartamento de Oliver. Créditos: Disney/Patrick Harbron
O design da penthouse combina sempre com a personalidade da personagem que a ocupa?
Sim, 100%, porque a piada constante com a penthouse é que a arquitetura praticamente não muda, mas toda a decoração muda completamente consoante as personagens que lá estejam. Desde a sua primeira conceção, na primeira temporada — quando era do Sting —, até à terceira temporada — que foi a casa do Paul Rudd —, era uma espécie de casa com uma homenagem ao estilo Hard Rock Café, cheia de memorabilia das suas atuações e filmes, brinquedos de heróis de ação, entre outras coisas. Na temporada anterior, foi um escritório de produções para os irmãos e irmãs. Assim, todos os anos, o espaço é completamente adaptado à ação e às personagens que o vão ocupar. A parte divertida é manter o máximo possível o plano arquitetónico reconhecível, mas transformar completamente o espaço, para que cada ano tenha um tom diferente.
Quais foram os cenários mais desafiantes que fez nesta quinta temporada?
Definitivamente, o casino subterrâneo e o átrio. O átrio teve os seus próprios desafios, apesar de existir essencialmente um design prévio devido à necessidade de copiar uma localização real. Mas fabricar todos aqueles detalhes elaborados e ornamentados, todos personalizados, foi um grande desafio a planear, tanto em termos de tempo como financeiros. O casino, por outro lado, foi construído do zero. Isso implicou criar o design, desenhá-lo, ilustrá-lo, preparar as plantas para construção e tudo o mais. Esse foi o principal desafio. Além disso, nesse casino de jogos, inicialmente vemos apenas uma parte, mas há outras áreas que vão sendo reveladas durante a temporada, como salas de repouso e outras partes que não posso revelar, porque o público só as verá no final.
O Casino. Créditos: Disney/Patrick Harbron
E qual foi o seu cenário favorito?
Também o casino, porque nunca tínhamos feito algo com essa energia para o Arconia antes, e foi uma oportunidade para ser um pouco mais teatral e ligá-lo a elementos que já tínhamos estabelecido, elevando qualidades que já definiram o edifício em geral e honrando detalhes e estilos arquitetónicos originais, misturando com alguma decoração clássica e contemporânea que refletisse todos os diferentes períodos em que as salas de jogos existiram. Vemos isso no episódio três, com flashbacks dos anos 20, 50 e 60, e uma versão mais moderna. Por isso tivemos decoração diferente para cada um desses períodos. Foi das coisas mais divertidas porque foi o cenário maior e mais diferente que tivemos no estúdio.
Os Easter eggs (mensagens ou detalhes ocultos) captam sempre a atenção dos fãs e resultam, muitas vezes, em teorias espalhadas pelas redes sociais. Nesta temporada, encontramos nos cenários estes detalhes?
Pode-se realmente observar alguns detalhes no átrio que têm a ver com o Lester, o porteiro. Vêem-se alguns na penthouse da Althea, que se relacionam com a atriz Beanie Feldstein e a sua personagem. Também fizemos cenários para a parte dos empregados do edifício, como no episódio cinco e seguintes. Um pouco antes, vemos uma espécie de vestiário para os porteiros e o seu staff, e outros funcionários. Depois, a meio da temporada, a Mabel e o Oliver começam a explorar as áreas da cave, onde fica a sala do lixo e onde está a Ursula, uma personagem que foi introduzida na primeira temporada. Faz parte da equipa de manutenção, mas tem um pequeno negócio paralelo a vender leite fresco. Vemos todas essas áreas, que também são cenários construídos — uma exploração das caves. E há muitos Easter eggs nessas cenas, quando as personagens andam a investigar. Um dos melhores é um dos figurinos, que eu não tinha reparado durante as filmagens e só notei ao ver o episódio transmitido. Se repararem bem, e para quem viu todas as temporadas, o ator que faz o papel de trabalhador do lixo — que recolhe o lixo de todo o Arconia — está a usar uma peça de vestuário que foi um adereço importante na terceira temporada. Achei muito inteligente da parte dos designers terem incluído isso, porque é uma peça de roupa que, provavelmente, uma das personagens tenha deitado fora no passado. Já que ele conhece as pessoas pelo lixo, isso é divertido.



