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Mulheres ganham menos

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O que se passa com as mulheres dos outros países da União Europeia? A UE diz agora que é importante aumentar a participação das mulheres…

Pela primeira vez, em 2000, no âmbito da estratégia europeia de emprego, a Europa define uma taxa de emprego que todos os países da União Europeia devem atingir. Era uma meta quantificada. Na altura, a União Europeia era composta por 15 países, e definia-se que, até 2010, todos deviam atingir uma taxa de emprego das mulheres de pelo menos 60%.

Achámos que, para nós, era fácil atingir as metas…

Sim! A verdade é que, em 2010, sete países não tinham atingido esse objetivo, o que me levou sempre a dizer que, também neste capítulo, a Europa andava a diferentes velocidades. A participação das mulheres no mercado de trabalho é uma dimensão fundamental da igualdade de género e da modernização das relações de género. Portugal tinha em 2010 uma taxa de 61,1%. De acordo com os últimos dados de que dispomos, houve um recuo de 14 anos na taxa de emprego das mulheres: não era tão baixa desde 1998.

Em termos laborais, onde é que as questões de género se notam mais?

Olhamos para o gap salarial entre homens e mulheres e ele tem-se mantido relativamente estável. É muito elevado: 18% no cômputo geral das remunerações. Quanto mais escolarizadas e qualificadas são as mulheres, mais penalizadas são. Por exemplo, entre as mulheres mais qualificadas nos quadros superiores, o desnível salarial é de 29%. O trabalho das mulheres e as funções que realizam tendem a ser desvalorizados.

Um homem e uma mulher fazem exatamente a mesma coisa e a mulher ganha menos 29% do que ele?

Se for quadro superior, em geral, sim. Como lhe disse, a diferença era de 18% nas remunerações e de 21% nos ganhos em geral.

Nos trabalhos mais mal remunerados, essa diferença diminui.

É menor. A discriminação aberta, direta, de pessoas a realizarem exatamente o mesmo trabalho e a terem diferentes remunerações tem vindo a diminuir. O que há são dimensões camufladas. Por exemplo, há pessoas que têm categorias diferentes mas, quando vamos analisar o que fazem, é praticamente igual.

Porém, aquilo que os homens fazem confere-lhes uma remuneração superior. Um caso que a SIC tratou há muitos anos foi o seguinte: ele era operário de limpeza de fornos, e ela operária de limpeza de aquários; ela ganhava muito menos do que ele. No entanto, olhando para o conteúdo funcional, era praticamente o mesmo. É a este nível que as coisas se colocam. Para a minha tese de doutoramento, entrevistei quadros superiores na área das tecnologias de informação e comunicação, e a certa altura comecei a reparar: ‘Afinal, tenho um número muito semelhante de homens e mulheres em quadros superiores nas empresas que estou a analisar.’

Porém, quando fui analisar os departamentos que uns e outras geriam, eram muito diferentes. Não estavam, por exemplo, na área mais estratégica, a área de negócios, de desenvolvimento de produto, a área financeira. Elas estavam nas áreas mais acessórias: marketing, comunicação, recursos humanos, menos valorizadas pelas organizações. Eram quadros superiores, mas, quando ia avaliar as suas remunerações, o diferencial era muito significativo.

Isto acontece na mesma organização? O que significa esta diferença para os direitos das mulheres?

Sim, acontece. É completamente redutor não pensar nos ganhos políticos e cívicos dos direitos que estão consagrados na legislação, todos os direitos políticos de igualdade. Há ganhos evidentes que as mulheres têm feito e que devemos assinalar. No entanto, temos um desfasamento enorme do que é a igualdade, esta discrepância na prática, além, obviamente, de algumas conquistas que não podemos dar por garantidas.

Há uma vigilância social que é muito necessária. Depois, há estas sombras do presente, da enorme vulnerabilidade laboral a que as mulheres estão sujeitas. Há outro grande problema relativamente ao mercado de trabalho: a baixíssima percentagem de mulheres nos lugares de representação da esfera económica. Olhamos, por exemplo, para as 20 empresas mais cotadas na Bolsa e temos 256 membros no conselho de administração, com apenas 18 mulheres. Houve ganhos, mas há sombras. O caminho do progresso tem sido muito lento.

O que nos está a travar?

É sabido que a questão da articulação com a vida familiar é um dos principais obstáculos à carreira da mulher. À luz daquilo que significa fazer uma carreira profissional, muitas mulheres têm de prescindir de parte dos seus projetos de vida, ou até mesmo da sua identidade. A maternidade está muito presente nos projetos de vida das mulheres, é uma dimensão fundamental da sua identidade.

Como a representação ideal de carreira tem muito a ver com essa visão tradicional de alguém com poucas responsabilidades familiares, as pessoas que são premiadas com possibilidades de desenvolver a carreira são as que se mostram mais disponíveis para viajar aos fins de semana, para trabalhar nos feriados, para obter práticas de trabalho fora da hora de exerção, toda uma disponibilidade que as mulheres não têm tanto quanto os homens.

As questões da articulação com a vida familiar têm um peso muito, muito importante. Depois, há os estereótipos de género, que continuam muito presentes: a ideia de que um bom gestor deve ser está muito colada ao poder, à competitividade, à racionalidade. É nessas redes sociais informais onde as mulheres não estão que circula a informação. Não quer dizer que o convite seja feito ali, mas há informações privilegiadas, as pessoas são vistas. O autoconceito das mulheres é muito importante.

O que é que acontece às mulheres com aspiração de carreira quando entram para uma organização? O que elas veem é que a possibilidade de uma mulher chegar ao topo é muito reduzida. Os constrangimentos reais objetivos evoluem da nossa perceção. Há muitas vezes um downsizing das nossas ambições profissionais. Se só os homens chegam aos lugares de topo, ganha relevo a ideia de que um bom gestor é um homem.

O que diz fazer sentido é implementar finalmente as quotas, para as mulheres serem mais representadas.

Eu sou a favor das quotas. Obviamente, elas são um mal necessário, mas o que os estudos nos vão dizendo é que temos de esperar muitos anos para que a situação de paridade se verifique. O que verificámos foi que os países que implementaram as quotas são os mais avançados, seja em termos políticos seja em atividade económica. A Noruega, por exemplo, que é o país que mais se aproxima da paridade, adotou o sistema de quotas.

Atualmente, o retrato que preferia estar a desenhar de Portugal é um retrato em que as mulheres já tiveram a oportunidade de chegar aos lugares de topo. Não tendo tido, temos de pensar em mecanismos que obriguem as empresas a reconsiderar os mecanismos de promoção e recrutamento internos. Pode ser apoiado, com apoios à implementação de planos para a igualdade. As empresas devem ser estimuladas a autorregularem-se, e algumas empresas devem equacionar a situação das quotas.

A atual secretária de Estado tomou uma decisão que considero muito positiva: dizer que as empresas do setor empresarial do Estado, por exemplo, numa ótica de boa governação, deveriam adotar planos para a igualdade. Tornou claramente obrigatória essa adoção, para as empresas do setor empresarial do Estado. Recomenda às empresas que adotem esses planos, mas torna vinculativa a decisão para o setor empresarial do Estado. Não podia estar mais de acordo! Se há setor de atividade económica que tem de dar o exemplo da igualdade, é o setor empresarial do Estado.

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