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Jorge Pina: “O desporto salvou-me, mas a cegueira também”

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A propósito da 2.ª edição da campanha Rexona Corre Por Mais falámos com Jorge Pina, ex-pugilista à conquista do título de Campeão do Mundo e que viu a sua vida mudar radicalmente no momento em que perdeu 90% da visão.

Forçado a abandonar o pugilismo, trocou os ringues de combate pelas estradas e abraçou uma outra paixão: o atletismo.

Em 2008, representou Portugal nos Jogos Olímpicos de Pequim, e repetiu o feito em 2012, em Londres. Pelo meio, em 2010, conquistou a medalha de prata na Maratona de Paris e fundou a Associação Jorge Pina, onde aplica o seu conhecimento e o seu entusiasmo pela vida junto de jovens que procuram superar-se.

Mais recentemente, no início de 2015, inaugurou a Escola de Atletismo Adaptado em Portugal, a primeira do género no País. Estivemos à conversa com o atleta e percebemos que os seus sonhos não ficam por aqui

Vai correr hoje?

Pela segunda vez. Vou fazer o meu treino bidiário. Já corri de manhã, 7 km. Estou habituado. Corro todos os dias. Costumo dizer que até a dormir corro.

Então nunca para de correr! As pessoas que têm vindo correr no âmbito desta campanha da Rexona, desafiam-no?

Algumas desafiam-me. Mas, geralmente, quando me encontram, já eu estou a correr, e eu é que lhes lanço o desafio. É este o objetivo, desafiar os portugueses. É o que esta campanha quer fazer: não só ajudar a Associação [Jorge Pina] mas ajudar os portugueses a terem hábitos saudáveis. Porque ao ajudarem a Associação, eles estão também a ajudar-se a si próprios. E tenho já recebido feedbacks de pessoas que me dizem: “Você pôs-me a correr. Eu não corria, porque tinha um problema, e voltei a correr só por sua causa. Obrigado.” E eu também agradeço sempre. Porque são eles que fazem com que a Escola [de Atletismo Adaptado] possa continuar. Porque nós queremos ajudar mais jovens e queremos também ir mais longe, mais além.

Ainda mais?

Sim. Se calhar ter outra escola noutra parte de Portugal.

Em que sítio?

Primeiro, temos de fazer sondagens. Isso é mesmo necessário. Não basta querer criar uma outra escola. Temos de saber quantas pessoas vamos ajudar com essa escola, quantas pessoas com deficiência há nessa determinada zona, se há facilidades que lhes permitam deslocar-se até à escola, arranjar parceiros nesse sítio que queiram abraçar o projeto… Sempre com a Rexona como parceira. Achamos que a Rexona está a mostrar às outras empresas o que é a responsabilidade social ao ajudar estas associações e instituições que não têm nada. E eu descobri que a Unilever Jerónimo Martins tem por hábito associar-se a causas sociais. Todas as marcas têm uma causa por trás. Isso deixa-me feliz. E ainda bem que a Rexona quis apoiar o meu sonho, que era um sonho que eu tinha há muito tempo, e deixou que as outras pessoas pudessem sonhar comigo.

É sobre sonhos e vontades que esta campanha fala. ‘Onde há vontade não há limitações’ é o mote. Para si, tudo é possível?

Para mim tudo é possível. Não há impossíveis. Gosto de sonhar. Gosto de realizar. Gosto de desafios. Gosto que me digam que é difícil, pois isso faz-me ter mais força para continuar e mostrar que é possível.

Agora deixei de ver com os olhos do mundo e passei a ver com os outros olhos, os olhos da alma, do coração. E a ver o invisível.

Onde é que vai buscar essa força?

Dentro de mim. Sou uma pessoa muito espiritual. Tento encontrar em mim essa força divina que eu sei que existe e sei que todas as pessoas têm dentro delas. Sou igual a todos os outros e acho que todos nós temos grandes capacidades que ainda não foram exploradas, e eu estou a tentar motivar as pessoas para procurarem essa força dentro delas.

Já tinha essa força antes de perder a visão?

Eu acho que ela estava escondida atrás dos meus olhos e da minha visão do mundo. Agora deixei de ver com os olhos do mundo e passei a ver com os outros olhos, os olhos da alma, do coração. E a ver o invisível. E tento ver aquilo que ninguém vê. Ando sempre à procura. Muitos buscam o ‘ter’, mas eu procuro o ‘ser’. Acho que andamos todos enganados e iludidos com o mundo, com aquilo que os olhos nos mostram, e esquecemo-nos de sentir o que o coração fala. Eu acho que é isso que temos de procurar.

Na adolescência, conviveu de perto com a delinquência. O desporto foi a sua salvação?

O desporto salvou-me, mas a cegueira também. E o encontro com o meu ser interior também me salvou. Podia ter escolhido muitos caminhos depois da cegueira, mas acho que depois da tempestade vem sempre a bonança. E apesar de tudo aquilo que me aconteceu, ainda havia muita felicidade, ainda havia muita coisa por descobrir.

O que é que descobriu?

Que acho que estou aqui para mostrar alguma coisa a alguém. Sinto-me um mensageiro. Descobri isto desta forma. Não quero que as outras pessoas tenham de descobrir da mesma forma que eu. Mas eu tive de cegar e passar por tudo o que passei para me transformar na pessoa que sou hoje.

A adaptação foi dura. O boxe era a minha paixão.

Como é que se iniciou no desporto?

Comecei com 11 anos, a jogar à bola. Mas logo descobri que tinha mais jeito com as mãos, então fui para o boxe. Depois do boxe veio a cegueira. E então descobri o atletismo adaptado. E agora sou atleta paraolímpico, já fui a dois Jogos Olímpicos [Pequim, 2008, e Londres, 2012] e quero continuar a correr. Porque a vida é uma corrida. Mas quero fazê-la não em cem metros, mas sim numa maratona, numa longa maratona. Eu quero desfrutar da vida. Quero que ela dure, e dure… Se calhar vou passar para as ultramaratonas [risos].

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