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E se as suas metas falharem todas este ano?

Eu não faço resoluções de ano novo.

Com exceção de um cafezinho, que é mesmo aquilo que almejo e procuro quando reinicio cada nova aurora (e tem para mim o sabor de um abraço líquido e vigilante), eu não faço resoluções de ano novo.

Compreensivelmente, a maioria de nós acha a perspetiva de um novo ano incrivelmente motivadora e vê-a como um momento ótimo para definir metas. Isso foi especialmente verdade no final de 2020, quando, a meu ver, a ideia de um novo começo era absolutamente irresistível.

Mas deixe-me ‘bancar’ hoje o papel de “advogada do diabo”, por um momento e perguntar-lhe: todos nós não temos razões diferentes para estabelecer os nossos próprios objectivos? Seguramente que sim.

Para mim, um novo ano é arbitrário, enquanto para alguns, é uma página em branco – um ‘driver’ poderoso e um parâmetro prático para medir o progresso.

Na psicologia, uma das razões mais importantes para estabelecer metas e objectivos é aumentar o nosso bem-estar. Quando escolhemos defini-los e se escolhemos ajustá-los, são partes potenciais dos nossos avanços, desde que ressoem com os nossos valores.

Então, e o que é que isto tudo importa?

Na senda da auto-determinação, perseguir os nossos objectivos deve ser significativo. Definir metas auto-concordantes é o que importa e a busca em si deve trazer-nos alegria e não o que costuma acontecer na maioria dos casos, em que a realização das metas faz-se acompanhar de pressão, cobrança, auto-ressentimento e frustração. Não é por acaso que, de acordo com os estudos, em 80% da população a motivação para a prossecução das suas metas ou resoluções de ano novo cai a pique logo em Fevereiro. Significativo, não?

Por vezes também eu me cobro muito e isso irrita-me bastante. É como se eu tivesse um operador de telemarketing na minha cabeça a ligar-me de hora a hora e a dizer-me: “Dona Sandra” – eles nunca acertam no meu nome – “está na hora de x, y e z”.

Equipamento desportivo novo que está a ganhar mofo na gaveta, raquetes de ténis que eu comprei e revendi ainda dentro da caixa, pilhas enormes de livros que eu só li pela metade. Estão na minha mesa-de-cabeceira, como se em algum momento eu fosse decidir retomar do ponto em que parei no ano passado em vez de simplesmente começar um novo.

Cursos online – uns de acesso vitalício (benditos sois vós!), outros já expirados – e anuidades de apps que eu pago, aparentemente, apenas para apoiar o mercado da educação.

Muitas destas e outras coisas têm que ver com alguma parte minha que ficou para trás. E, honestamente? Eu não detesto nada disso.

Somos feitos tanto daquilo que deixamos para trás quanto daquilo que levamos adiante. Aquilo em que eu não me tornei é tão importante para mim como aquilo que sou.

Alguns dos livros que li pela metade formaram-me mais do que muitos que li até ao fim. Os sonhos que morreram na praia não formam um cemitério lúgubre – são flores que brotaram num jardim e não duraram muito tempo. Foram bonitas enquanto existiram e hoje o terreno está livre para brotarem outras (e muitas vezes, melhores) coisas.

Então, se algum dos planos que eu fiz para este ano não for muito para a frente… que assim seja. A tentativa já é válida o suficiente. E não, não estou a escrever nenhuma Ode ao inacabado, ao natimorto, ao não vingado, mas já me bastam os coaches de produtividade nas redes sociais a gritar que todos os objetivos dependem de um plano com começo, meio e fim.

Por isso venho aqui para tentar desligar a cobrança e antes propor um brinde aos planos que não precisam acontecer. A gente lança uma sementinha, mas tudo bem se não vingar… Um brinde também às coisas que nascem sem planeamento e tomam conta da nossa vida de uma maneira surpreendente, como um bolbo que cresce sem atenção e de repente, quando damos por isso, tornou-se uma flor bonita.

E já agora um terceiro brinde (só cuidado para não beberem muito) aos sonhos que levamos a sério. Eles existem também, e neles uma pessoa persiste. Não por obrigação, mas porque a vontade é tanta que nos mantém ali, a perseverar no cuidado até que brotem.

Entre um tipo de plano e outro, o nosso jardim fica bem bonito e harmonioso, pois em verdade lhe digo: a felicidade que vem das conquistas é real, mas é fugidia. Escorre por entre os dedos à medida que as nossas mentes se dão por satisfeitas com o que já temos e passam a querer mais.

Nunca vai ser suficiente – mas eu e você já somos suficientes. Acredito que podemos ser felizes sendo quem já somos (claro, melhorando o que for para melhorar, mas com base e em respeito do que somos ou podemos ser). Claro que as coisas podem ser sempre melhores, e se fizermos tudo o que estiver ao nosso alcance, um dia serão mesmo. Mas eu acredito que talvez não precisemos “chegar lá” para desfrutar da felicidade que já é possível no aqui e agora.

Curioso que Aristóteles ou Kant acreditavam que, em última análise, não importa se alcançamos as nossas metas ou não. Ele acreditava que a busca ativa da virtude, do caminho percorrido ou a percorrer, é a própria definição de felicidade, não o estado final.

Porém, a maioria de nós estabelece metas que queremos realizar e, por esse motivo, a motivação é fundamental. Contando que você saiba o que realmente quer, e que isso esteja profundamente alinhado consigo (auto-conhecimento aqui é essencial) a minha sugestão é que defina as suas metas sempre que quiser.

Verifique, porém e “apenas”, se as define da maneira certa, explorando o seu “big why” ou o seu próprio porquê poderoso e certifique-se de que elas falam diretamente com os seus anseios, necessidades, potencialidades, vontades, sonhos e com os seus valores.

Porque na verdade, é “só” isso o que mais importa.

Do fundo do meu coração, renovo os meus votos para si de um Feliz 2023 e Obrigada por estar desse lado.

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Sara Ferreira

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