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Jorge Pina: “O desporto salvou-me, mas a cegueira também”

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Acha que as barreiras que ainda existem são impostas pela deficiência em si ou pela sociedade que ainda não permite que estas pessoas façam uma vida normal?

Nós sabemos que há estigmas. Sabemos que há pessoas que olham para nós e que já nos catalogam como deficientes. Os olhares são maus. Mas acho que também estamos a mudar isso e que a sociedade está a moldar-se e a aprender a viver com estas pessoas.

Precisamos de empresas mais despertas para a responsabilidade social e para estas causas, não só no desporto como na vida.

E esta escola é a prova de que é possível estas pessoas realizarem os seus sonhos e levarem uma vida sem barreiras…

Sim, é possível realizarem os seus sonhos, mas também é preciso haver outras pessoas que ajudem esses sonhos a realizarem-se, não é? Se houver muitas barreiras e se não houver ajuda, eu posso querer fazer muita coisa e não conseguir. Eu também sonhei com esta escola. Mas se não houvesse a Rexona, ela não existiria. Precisamos de empresas mais despertas para a responsabilidade social e para estas causas, não só no desporto como na vida. Como com a inserção destes jovens no mercado de trabalho. Na Escola de Atletismo Adaptado, não há exclusão de idades nem de deficiência. E queremos que ela também seja aberta às pessoas normais, para que possam ajudar aqueles que têm deficiências físicas, e assim criar uma inclusão a todos os níveis. Quando nos ajudamos uns aos outros, ajudamo-nos a nós próprios. E eu sinto-me bem, sinto-me feliz quando ajudo. Até costumo fazer palestras em prisões, onde vou contar a minha experiência. Digo-lhes que quando saírem terão de olhar para o mundo de uma forma diferente. Que eles são exemplos, para aqueles que estão cá fora não irem lá para dentro. Eu quero que todas as pessoas consigam encontrar o entendimento e a sabedoria, que não é só o ‘saber de escola’, é também o saber entender o mundo. Não condenar, não julgar. Aceitar.

É isso que tenta fazer na escola, diariamente?

Na escola e com a minha vida. Eu aceito as minhas dificuldades, aceito os meus erros, e também aceito os erros dos outros. Ninguém é perfeito e todos estamos numa constante aprendizagem. É claro que às vezes fico magoado com coisas que me acontecem e com coisas que os outros me fazem, mas eles devem aprender como também eu aprendi. Mas não da mesma forma, entende?

Aceita também aquilo que lhe aconteceu?

Convivo bem com isso. Se eu não aceitasse, seria um revoltado.

E é totalmente o oposto disso…

Sou totalmente o oposto! Sou uma pessoa muito feliz.

É mais feliz agora?

Sou! Antes andava cego com o mundo. Não desfrutava da vida, do sabor da vida. E, se calhar, não ajudava os outros como estou a ajudar agora. Digo-lhe: se não me tivesse acontecido aquilo que me aconteceu, eu não estaria aqui agora. Não estaria a ajudar as pessoas que estou a ajudar. Não daria um exemplo de vida às pessoas para que elas superem as suas dificuldades. Não teria a vida que tenho hoje. Não poderia ajudar os jovens… Não valia a pena chorar. Tenho uma frase que costumo dizer: ‘Limpam-se as lágrimas, curam-se as feridas e partimos para outra corrida.’ E foi isso que eu fiz. Parti à procura de novos desafios, de novos projetos.

E que mais projetos tem? Falou há pouco do livro…

Quero que seja um livro de Natal. Penso lançá-lo ainda este ano.

E qual vai ser o título?

[pausa] “A Visão Depois da Cegueira”.

O que é que lhe falta fazer e ainda espera alcançar?

Agora é construir a sede social da Associação. A Câmara Municipal cedeu-nos um espaço de 1400 m2, onde queremos construir uma Academia Jorge Pina, com espaço para os atletas da Escola treinarem quando chove, com um atelier de tempos livres, vai ter um ginásio, um espaço de meditação… A parte espiritual terá de estar presente. Não pode ser só trabalhar o corpo, temos de trabalhar o espírito e a mente, porque também é isso que nos fortalece. Se não tivermos uma boa mente e um bom espírito, se calhar não conseguimos ultrapassar as dificuldades e as barreiras que nos aparecem. A sede vai ser uma casa onde as pessoas possam sentir-se bem. E vai estar aberta a todos. Vai ser não a sede da Associação mas a casa de todos aqueles que quiserem frequentar aquele espaço. São todos bem-vindos.

Imagem de destaque: Jorge Pina. Foto retirada do Facebook da Associação Jorge Pina.

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